sexta-feira, 29 de julho de 2016

Com US$ 52 trilhões em papel podre o Deutsche Bank aderna



Após perdas de US$ 7,3 bi no ano passado e suspender pagamento de dividendos, maior banco alemão anuncia queda de 98% nos lucros no segundo trimestre

Depois de ter sofrido perdas de US$ 7,3 bilhões no ano passado e anunciado a suspensão do pagamento de dividendos por dois anos, a saída de dez países, a venda de subsidiárias e a demissão de até 35 mil funcionários, o Deutsche Bank, o maior banco alemão, anunciou que seu lucro, no segundo trimestre de 2016, despencou 98%, para US$ 22 milhões, comparado com US$ 818 milhões de um ano atrás. Desde o início do ano, suas ações já encolheram 45%, atingindo o recorde de baixa e com o “valor de mercado” do Deutsche Bank reduzido a 8% do que “valia” no pico da especulação em 2007.
Desde 2008 – depois de ter virado um conduíte para a venda em massa de papéis podres emitidos pelos bancos norte-americanos no mercado europeu -, a crise do Deutsche Bank não amaina e, de acordo com os números de março do próprio banco, está soterrado por US$ 52 trilhões de derivativos, o que levou o FMI a declará-lo no dia 29 de junho como “o mais importante contribuidor líquido para riscos sistêmicos” do sistema financeiro global. Problema que se agrava, diante do papel central que o banco representa para a economia alemã, cujas principais corporações têm vínculos com o banco.
A subordinação do Deutsche Bank a Wall Street chegara a um ponto tal que, durante o bailout de 2008/9, recebeu US$ 11,8 bilhões de socorro do Federal Reserve, via a AIG, apesar de ser um banco estrangeiro. Também foi, no auge da crise, o segundo maior tomador de uma linha de empréstimos de juros baixíssimos do Fed e o maior usuário do programa “Term Asset-Backed Securities Lending Facility”, que o permitiu descartar US$ 290 bilhões de papéis podres.
Nada menos que 70% dos lucros do Deutsche Bank provinham dessas operações especulativas, e depois do crash jamais conseguiu remontar essa pirâmide. (Como relata o jornalista Michael Lewis, os especuladores norte-americanos se divertiam com os “idiotas alemães” que seguiam comprando lixo tóxico nos meses de frenesi que antecederam o crash).
Após o fiasco deste primeiro trimestre, o atual CEO do Deutsche Bank, o inglês John Cryan, que no pipoco de janeiro viera a público asseverar que o banco “era sólido como uma rocha”, mudou de tom, dizendo que a reestruturação terá de ser “mais rápida e com mais intensidade”. Na época da primeira declaração, o ministro das Finanças alemão, e carrasco de gregos, portugueses, italianos, irlandeses, cipriotas e espanhóis, Wolfgang Schauble, dissera que “não se preocupava” com o Deutsche Bank.

JURAS
 
Tais juras não lograram abafar os persistentes rumores de que o Deutsche marcha para o colapso. Segundo declaração do Berenberg Bank, provavelmente o mais antigo banco alemão, que existe desde o século XVI, os problemas do Deutsche Bank podem ser “intransponíveis” devido à alavacagem de 40 vezes. Isto é, os papéis podres e dívidas do DB são quarenta vezes maiores que sua base de capital próprio.
Os banqueiros alemães se lambuzaram do outro lado do Atlântico, desde as fraudes da Enron e World.com até a montanha de hipotecas subprime que ruiu em 2008. Não há uma trapaça em que não hajam se metido, como a manipulação da taxa libor e suas congêneres europeia e japonesa. Trapacearam com ações, câmbio e juros e sofrem processos de Nova Iorque a Moscou, passando por Londres e Bruxelas.
O banco acabou multado pelos órgãos reguladores britânicos e americanos em US$ 2,5 bilhões e dois executivos forçados a se demitir. Como disse um procurador do caso, o Deutsche Bank “secretamente conspirou com seus competidores” [Citibank, Merrill Lynch, BNP Paribas, UBS, Barclays e Société General] para “fraudar as taxas de juro referenciais no coração do sistema financeiro global”.
São esses processos em curso e prováveis multas adicionais que forçaram o Deutsche a provisionar US$ 7,3 bilhões mas muitos analistas prevêem que o total será ainda maior. Outra pesada multa que aguarda o banco é pura chantagem – por ter feito negócios com países contra os quais os EUA aplicaram sanções, como a Rússia e o Irã – o que é parte da campanha pró TTIP.
A tentativa de escorar seu ‘banco de investimento’ que desmoronou segue a trancos e barrancos. Uma das unidades de especulação em operação nos EUA falhou recentemente no ‘teste de estresse’ realizado pelo Federal Reserve.
 
Em fevereiro, os rumores de que o Deutsche não teria dinheiro para pagar o juro de papéis de dívida especiais que emitira – os chamados “CoCo” -, que pagam 6% e podem ser transformados em ações, forçaram a direção do banco a anunciar que poderia recomprar até US$ 5,1 bilhões desses papéis, após a perda sobre o valor de face ultrapassar os 30%.
Em relação ao Deutsche Bank, o que não faltam são notícias ruins. No trimestre, as receitas encolheram 12%, sendo que a receita da unidade de especulação nos “mercados globais” despencou 28% ano-sobre-ano. A única divisão que aumentou receitas e lucros foi o Postbank [Banco Postal]– justamente a que Cryan quer vender para fazer caixa, e cujo preço já abateu quase pela metade, dos iniciais US$ 4 bilhões. As operações com papéis de dívida tombaram 19%, enquanto nos competidores ianques aumentaram 22%.

EXPOSIÇÃO
 
Entre as fontes de problemas, há ainda a exposição do Deutsche ao desmanche de preços no setor de energia e commodities. Também os efeitos, sobre os lucros dos bancos, da política do BCE de juros reais negativos. Sem esquecer o Brexit, a saída da Grã Bretanha da União Europeia, quando 19% das receitas do banco provêm das operações em Londres. Assim como o arrocho capitaneado por Merkel, que mantém a zona do euro estagnada ou sob recessão aberta, e a desaceleração da economia chinesa.
Editorial do jornal Frankfurter Allgemeine Zeitung expressa com fidelidade a tensão que a crise do Deutsche Bank provoca na Alemanha. “O que se pode pensar de um banco que tem de prometer a seus clientes e investidores que é capaz de pagar de volta créditos? Quão sólido é um banco que sangrou um terço de seu valor de mercado em um mês, e metade dele ao longo de um ano? Não é mais apenas os clientes de um par de bancos gregos que estão perguntando tais duras questões, mas os clientes do Deutsche Bank”. Conhecendo a devastação cometida contra a Grécia para proteger os bancos alemães, não resta dúvida a disposição dos banqueiros do Deutsche para se manterem como o elo vital entre a ocupação da Alemanha pelos EUA e a trapaça generalizada de um lado e outro do Atlântico.
 
              ANTONIO PIMENTA
http://www.horadopovo.com.br/

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