sexta-feira, 8 de julho de 2016

Brexit, euro-austeridade e TTIP


                                     MICHAEL HUDSON*

    Nos Estados Unidos, os meios de comunicação trataram a votação no Reino Unido contra a permanência na União Europeia (UE) como se fosse um "trumpismo" populista, uma votação desarti-culada, surgida da ignorância daqueles que foram deixados para trás pela política de crescimento econômico neoliberal. O fato de que Donald Trump estivesse por acaso na Escócia para promover o seu campo de golfe ajudou a estruturar a estória dos Estados Unidos que descreve a votação do Brexit como um psicodrama-populista "Trump versus Hillary", colérico e ressentido, contra a política inteligente.


O que fica de fora desse quadro é que há uma lógica saudável para se opor à condição de membro da UE. É o slogan "Recupere o controle".
A questão é, recupere de quem? Não só dos "burocratas" se deve recuperar o controle, mas das regras anti-trabalho e favoráveis à banca escritas nos tratados da eurozona, de Lisboa e de Maastricht.
Os jornais britânicos opuseram-se à UE mostrando os burocratas de Bruxelas não são eleitos por ninguém fazendo leis que submetem a Grã-Bretanha. O argumento era em grande medida um apelo nacionalista por "leis britânicas para socorrer o povo britânico".
O problema real não é simplesmente que burocratas fiquem fazendo as leis, mas o tipo de leis que fazem: a favor dos bancos, da austeridade anti-trabalho. A política fiscal e os gastos públicos foram retirados das mãos dos governos nacionais e entregues aos centros financeiros especulativos. Eles insistem na austeridade e em arrochar as pensões e os programas de gastos sociais.
Os tratados de Maastricht e de Lisboa – juntamente com a constituição alemã – impedem a eurozona de ter um banco central que gaste dinheiro para reviver a economia europeia. Em vez de trabalhar para aliviar a economia da deflação da dívida que se tem verificado desde 2008, o Banco Central Europeu (BCE) financia os bancos e obriga os governos a salvar de perdas os possuidores de títulos, ao invés de cancelar parcialmente dívidas podres.
Na questão central, os burocratas de Bruxelas são bastante suscetíveis às pressões dos Estados Unidos para assinar o TTIP: o Tratado de Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento neoliberal da administração Obama. Isso é um programa corporativo que transfere a política de regulação para mãos corporativas, tirando-a do governo: política ambiental, política de saúde pública e de controle de alimentos para começar.
A burocracia de Bruxelas foi sequestrada não só pelos bancos como também pela OTAN. Ela pretende que há um perigo real da Rússia organizar uma invasão militar na Europa.
Essa ameaça fictícia é a desculpa para reservar 2% dos orçamentos europeus para gastos com compras de armas do complexo militar-industrial dos EUA e dos seus congêneres na França e em outros países. Os belicistas de Bruxelas-OTAN são utilizados para descrever a esquerda favorável ao trabalho como "frouxa" quanto à segurança nacional – como se a Europa realmente enfrentasse um problema de invasão russa. Oponentes à euroausteridade são pintados como agentes de Putin.
Há uma outra economia europeia que é possível. Mas ela não pode ser construída sobre as fundações atuais. É necessário dissolver a eurozona para reconstruir uma Europa favorável ao trabalho.


* Autor de Killing the Host (Matando o Hospedeiro),
email: mh@michael-hudson.com.
O original encontra-se em www.counterpunch.org.a.
http://www.horadopovo.com.br/

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