segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

BC golpeia economia com Selic a 10% e o maior juro real do mundo


Objetivo é drenar dinheiro para especuladores
Disse a presidente Dilma ao jornal espanhol “El País” que, ao contrário da Espanha, “nós temos superávit primário. A discussão no Brasil é se o superávit primário será de 1,8%, 1,9% ou 2%”.
Ainda não localizamos nenhuma discussão no Brasil sobre se o desvio de verbas públicas para os bancos deve ser de 1,8%, 1,9% ou 2% do PIB. A presidente Dilma, provavelmente, deve estar confundindo o Brasil com a mídia reacionária – e a algaravia desta última com “discussão”.
Mas não é por acaso tal confusão. Na quarta-feira, com sua total cumplicidade – mais exato seria dizer, incentivo –, o Banco Central aumentou os juros básicos para 10% na reunião do seu Comitê de Política Monetária (Copom). Trata-se do sextoaumento consecutivo de juros em sete meses, catapultando o juro real (descontada a inflação projetada para os próximos 12 meses) para +4,1%, quando a média internacional é -0,6%. O diferencial em relação aos juros básicos norte-americanos (que estão em -1,1%) passou a +5,2%, o que, na situação atual do mundo, é um ganho colossal - e às nossas custas - para os bilhões de dólares desvalorizados que invadem o país, atraídos por essas taxas de juros, deixando nossa economia, sobretudo a indústria, à mercê de uma agressão financeira, com a consequência de provocar mais estagnação, mais retrocesso, mais destruição de elos internos das cadeias produtivas.
Nem mesmo o BC, em seu comunicado, conseguiu repetir o pretexto rotineiro para seus aumentos de juros – um totalmente falso combate à inflação. Realmente, é difícil: em outubro, no acumulado do ano, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) estava em 4,38% - com previsão de 5,84% até o final do ano - e o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) estava em 4,26%.
Todas as conversas sobre aumentar o investimento são vigarice e demagogia quando se permite esse estúpido e continuado aumento de juros. Os juros altíssimos – e subindo – são totalmente antagônicos ao investimento, mais ainda ao seu aumento. Quem, exceto alguns poucos abnegados, irá investir na produção quando pode ganhar dezenas de vezes mais na especulação, sem nenhum risco – e sem nenhum trabalho? Sobretudo quando o próprio governo está cortando o investimento público.
Evidentemente, o objetivo desses aumentos de juros é drenar dinheiro para bancos e demais especuladores, desviando-o não somente do atendimento à população (as verbas da Saúde, Educação, etc.), não somente da Segurança e da Defesa, não somente do estímulo público à produção, mas também desviando dinheiro de toda a economia - em especial, da indústria nacional - para a mera agiotagem.
Porém, não existe crescimento sem indústria. Não existe crescimento da produção sem investimento na produção. Não existe aumento do investimento com juros altíssimos.
Diz o governo que o investimento virá das privatizações – ou seja, do BNDES, que, na visão desse pessoal, não pode financiar o investimento público ou privado nacional (exceto algumas exceções que confirmam a regra), mas pode e deve financiar açambarcadores da propriedade pública a juros subsidiados. O máximo que pode acontecer, na vigência desses juros, é a aplicação de dinheiro obtido do BNDES na ciranda financeira. O que não seria novidade, como o próprio governo sabe – ou deveria saber.
Há praticamente um “consenso” entre a malta financeira, a mídia e o governo, de que o BC aumentará os juros mais duas vezes, até atingir 10,5%, ou seja, até que o juro real – portanto, o ganho dos especuladores - volte ao intergaláctico patamar de julho de 2011. Por isso, o comunicado do Copom inicia com: “Dando prosseguimento ao processo de ajuste da taxa básica de juros” (grifo nosso). Ou seja, o aumento de quarta-feira é apenas mais um degrau no “prosseguimento”...
Mas há uma diferença, em relação ao primeiro semestre de 2011: naquela época, saíamos do crescimento no governo Lula (+7,5% no PIB e +10,5% na produção industrial); agora, o país está mais destruído economicamente, mais exausto depois de três anos de uma política econômica que vai contra todos os interesses e forças nacionais, e mais propenso à mobilização popular.
Mas o que se pode concluir dos seis aumentos de juros (e da promessa de mais dois)? Que a política do governo Dilma é paralisar as ações de governo (é esse o sentido do ridículo “pacto” para que o Congresso nada aprove que demande despesas), em especial qualquer ação que vise a tirar o país do atoleiro em que se encontra, para despejar o dinheiro público na especulação. O resto, os estrangeiros fazem – daí a ênfase nas “concessões” - com dinheiro do BNDES.
É assim que o governo pretende chegar às eleições.
A miséria mental, a mesquinhez, a falta de grandeza dessa política, é bastante evidente para que tenhamos de comentá-la. Mas há ainda algumas coisas a explicar.
Na entrevista ao “El País”, disse a presidente Dilma que, devido às manifestações do primeiro semestre, “fizemos o Pacto pela Mobilidade Social, que resultou em um investimento de 143 bilhões de reais em transporte coletivo urbano”.
Se fosse verdade, o governo teria gasto com mobilidade urbana este ano mais do que gastou com juros até agora (R$ 137 bilhões). Infelizmente, o governo não gastou nem os R$ 50 bilhões que a presidente Dilma prometeu no seu “pacto” - como confirmaram a ministra do Planejamento e o ministro das Cidades, há algumas semanas, no mais recente balanço do PAC.
Segundo a mídia “econômica”, a presidente Dilma, com esses aumentos de juros, outra vez os maiores do mundo, “está recuperando a credibilidade”. Resta saber com quem – certamente, com o povo é que não é. Nem com os bancos e multinacionais, que podem tratá-la, no máximo, como aquele personagem de Machado tratava o negro Pancrácio, tão agradecido pela alforria na véspera da abolição da escravatura (“Pancrácio aceitou tudo; aceitou até um peteleco que lhe dei no dia seguinte, por me não escovar bem as botas; efeitos da liberdade. Mas eu expliquei-lhe que o peteleco, sendo um impulso natural, não podia anular o direito civil adquirido por um título que lhe dei. Ele continuava livre, eu de mau humor; eram dois estados naturais, quase divinos”).
O servilismo torna-se um vício, mesmo quando tenta-se escondê-lo sob camadas de arrogância. Aliás, essa maquiagem apenas torna mais feio o vício.
Como não há inflação no presente, nem pode-se dizer que há risco de surto no futuro, sempre aparecem aqueles palhaços, em geral economistas de porta de banco, para dizer que o problema é o “passado inflacionário”. Que “passado”? Ora, disse o magano, a lei de recuperação do salário mínimo, essa terrível sobrevivência do passado (isto é, do governo Lula) que indexa terrivelmente a economia. Logo, a solução só pode ser a de acabar com o “passado”: com as leis do trabalho, com a previdência social, com os impostos que bancos e multinacionais ainda pagam - e com o salário mínimo. Tudo isso para “aumentar a competitividade” (donde se conclui que foi a Lei Áurea que acabou com a nossa “competitividade”). Para ter juros mais baixos, “tem de ter condições para ter juros mais baixos” (sic). Fora isso, “baixar juros é voluntarismo” (sic). Não é uma gracinha?
CARLOS LOPES

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