sexta-feira, 22 de março de 2013

Paulo Bernardo provoca o PT



Por Altamiro Borges

O ministro das Comunicações, o petista histórico Paulo Bernardo, parece que resolveu entrar em confronto com o seu partido. Num jornal que é declaradamente de oposição ao governo Dilma, o Estadão, ele criticou a nota aprovada pela direção nacional do PT, em reunião realizada em Fortaleza (CE) no início de março. Para ele, o documento que prega a urgência de uma regulação democrática da mídia é “incompreensível”. A reação à entrevista foi imediata, com muitos internautas condenando a “traíragem” do ministro.


Na entrevista à Agência Estado, Paulo Bernardo deu uma de esperto ao juntar as críticas partidárias à ausência do projeto de novo marco regulatório com as referentes às recentes isenções fiscais das poderosas teles: “É incompreensível que um partido que está há dez anos no governo seja contra a desoneração e critique o nosso esforço para baixar impostos... Alguns militantes nossos misturam regulação da mídia com investimentos em telecomunicações. Isso não pode acontecer. São assuntos separados”.

A nota do PT não juntou os dois temas, mas tratou de ambos os assuntos. Criticou a decisão do governo Dilma de não discutir o estratégico tema da democratização da comunicação, conclamando a militância petista a se engajar na coleta de assinaturas para o projeto de iniciativa popular do FNDC pela regulação da mídia; e criticou, também, os constantes privilégios concedidos às empresas de telecomunicações. A legenda tem apoiado o “esforço para baixar impostos” do governo, mas discorda dos subsídios às teles.

As marotas declarações do ministro foram saudadas pelo Estadão, que adora apostar na cisão das esquerdas. O jornalão ressaltou que, “para Bernardo, há ‘muita confusão’ sobre o que é marco regulatório. ‘A Constituição veda a censura e, portanto, o marco regulatório não pode ser confundido com controle da imprensa nem com nenhum tipo de controle de nada’, insistiu o ministro”. A confusão, neste caso, é do ministro e do Estadão, já que o FNDC nunca propôs qualquer medida de censura e nem o PT defende o “controle da mídia”.

“Todos os países têm algum tipo de regulação sobre os meios eletrônicos e não é cerceamento, ao contrário, procuram corresponder ao fato de que o direito à informação, à liberdade de expressão, é também um direito individual... É preciso que o Estado, em nome da sociedade, fixe parâmetros e regras que não implicam a restrição de conteúdo, mas normas de funcionamento para esses meios, que são cada vez mais poderosos, formam opiniões e difundem interesses”, explicou Rui Falcão, presidente do PT, ao sítio do FNDC.

Paulo Bernardo preferiu esquecer a posição histórica do seu partido e usou o palanque do Estadão para desqualificá-la. Pior para ele. A reação foi imediata. Uma das correntes internas do PT, a Articulação de Esquerda, já emitiu nota retrucando o ministro. Vários textos também foram postados na internet criticando-o. Um dos mais incisivos e consistentes foi escrito pelo jornalista Breno Altman, diretor do Opera Mundi e da revista Samuel, em artigo publicado hoje no sítio Brasil-274. Reproduzo-o abaixo na íntegra:

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"O PT deveria pedir a cabeça de Paulo Bernardo” 

As declarações do ministro das Comunicações, em entrevista ao jornal “O Estado de S. Paulo” no dia 19/3, constituem afronta à disciplina partidária. Sempre ausente nos debates organizados pelo PT e os movimentos sociais sobre o marco regulatório de sua área, Paulo Bernardo decidiu recorrer a um jornal adversário de seu partido para atacar publicamente resolução do diretório nacional da agremiação, em um tom de quase escárnio. 

Se o PT deixar tal comportamento sem resposta à altura, estará abrindo perigoso precedente para sua autoridade. Um governo de coalizão, afinal, é produto da aliança entre partidos, mesmo no sistema presidencialista. Não é um acordo entre o chefe de Estado e indivíduos que agem a seu bel prazer. Claro que a presidente pode nomear o assessor que bem quiser, como manda a Constituição, mas os partidos têm que deixar claro quem fala ou não em seu nome, para o bem da democracia.

Um fato recente, aliás, ilustrou essa regra do jogo. O PDT, agrupamento mais frágil e inorgânico que o PT, exigiu que o ministro do Trabalho, Brizola Neto, fosse substituído por um nome que melhor representasse a posição partidária. Sem qualquer juízo de valor sobre a troca, a atitude dos pedetistas foi pertinente. A presidente logo o compreendeu e negociou a substituição reivindicada.

O caso de Paulo Bernardo é muito mais grave. Diferentemente do caso citado, o ministro paranaense optou por um discurso de ruptura contra a orientação que o PT defende para o setor. Assumiu o papel de porta-voz dos interesses das grandes corporações de comunicação e telefonia. A presidente Dilma Rousseff pode até concordar com seu auxiliar e mantê-lo no posto, pois faz parte de seu livre-arbítrio presidencial. Mas se o PT não afirmar claramente que Bernardo quebrou laços de confiança, sairá diminuído do episódio. 

A senadora Heloísa Helena e outros parlamentares, no início do governo Lula, foram corretamente punidos porque votaram contra a orientação petista na reforma da Previdência. Não importa o mérito. Representantes públicos de um partido devem se submeter ao coletivo e suas instâncias. Se não o fazem, devem ser excluídos de suas funções. Não há outro caminho, na democracia, para o fortalecimento das instituições, a não ser que se aceite que carreiras pessoais sejam o epicentro da vida política.

No parlamentarismo, ao PT caberia votar moção de censura e derrubar o ministro, além de submetê-lo às regras estatutárias. Inexistindo esse instituto em nosso atual ordenamento, uma nota de condenação seria o mínimo razoável. Deixando claro à sociedade e à presidente que Paulo Bernardo não tem mais seu apoio para continuar no governo.

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