terça-feira, 31 de julho de 2012

Síria e as pretensões do imperialismo

Editorial do sítio Vermelho:

Ao iniciar seu giro pelo Oriente Médio (Tunísia, Egito, Jordânia e Israel), nesta segunda-feira (30), o secretário de Defesa dos Estados Unidos, Leon Panetta, indicou – como se fosse necessário – o caráter de sua visita ao brandir ameaças contra o governo da Síria.

A luta para derrotar as milícias que ameaçam Alepo (cidade que é o centro financeiro da Síria) será “um prego no caixão [do presidente Bashar al-] Assad” que, na opinião daquele alto dirigente do imperialismo dos EUA, “perdeu toda a legitimidade”. Ele afirmou também que o regime sírio “está chegando ao fim”.

A arrogância do dirigente estadunidense esbarra no senso comum mais trivial: há legitimidade quando um governo usa a força para manter a integridade de seu território e a segurança de sua população, dentro de suas fronteiras. Sobretudo quando ela é ameaçada por milícias – como ocorre na Síria – fortemente armadas e financiadas por países estrangeiros, e constituídas também por mercenários contratados no exterior.

Um levante armado dentro de uma nação caracteriza uma guerra civil e cabe aos beligerantes procurar, autonomamente, as maneiras mais adequadas para vencer. Não é o que ocorre na Síria. Embora o governo seja laico e existam fortes dissensões entre facções religiosas de sua população, o conflito na Síria vai muito além disso. O que alimenta os confrontos é a articulação entre os chamados “rebeldes” – na verdade milícias mercenárias –, o imperialismo dos EUA e da União Europeia, e grupos fundamentalistas religiosos, como a Al-Qaeda, que se constituíram numa frente armada contra o governo sírio. Seu objetivo não é o programa falso difundido pelo imperialismo através da mídia hegemônica, que alega “razões humanitárias” e defesa dos direitos humanos.

O programa oculto por trás desta alegação hipócrita é a derrota de um governo que é uma pedra no sapato do imperialismo, e de Israel, no Oriente Médio, cujos dirigentes vislumbraram, na chamada “primavera árabe”, a chance de dar uma aparência “democratizante” à derrota do regime de Assad.

Defrontou-se, entretanto, com uma realidade adversa para seus planos. Não pode repetir, na Síria, a mesma escalada agressiva cometida contra a Líbia em 2011 – o povo sírio não se comoveu com o canto de sereia do imperialismo, o poder militar da Síria é superior ao da Líbia no momento em que foi atacada, e encontrou uma resistência internacional mais decidida contra a ofensiva imperialista. As decisões do imperialismo não contam mais, nos organismos da ONU, com apoio semelhante ao obtido em 2011 contra a Líbia. Capitaneada por Rússia e China, a resistência contra as pretensões do imperialismo se acentuou e tem impedido a legitimação da agressão contra a Síria.

A batalha que se trava em Alepo, desde a semana passada, pode ser crucial. Ela tem revelado a disposição do governo sírio de resistir e demonstrado sua capacidade militar e organizativa para isso. Por outro lado, é nítida a desorganização das milícias mercenárias, além de exibir a compreensão que aquelas forças têm do que seja “democracia” e direitos humanos: multiplicam-se as notícias da aplicação de critérios religiosos em “julgamentos” de combatentes aprisionados, que são executados sumariamente, sem direito de defesa e à margem de qualquer legitimidade legal. Linchamento puro e simples, com base na Sharia, inaceitável num Estado laico e dotado de uma tradição de respeito ao Estado de Direito.

O próprio chefe dos observadores da ONU na Síria, o general Babacar Gaye, foi obrigado a indicar esta situação quando, ao manifestar sua preocupação com a continuidade da violência, disse: temos “que reconhecer que esta violência vem de ambas as partes".

Isto é, trata-se de uma luta aberta, provocada por milícias armadas pelo imperialismo e por monarquias árabes tradicionalistas e aliadas ao imperialismo. Autoridades estrangeiras que, hipocritamente, reclamam – como fez o secretário de Defesa dos EUA – quando o governo sírio defende sua população e seu território dos ataques promovidos por forças estrangeiras. A luta em Aleppo é decisiva: a vitória do imperialismo e seus aliados pavimentaria o caminho para mais agressões; sua derrota indicará o fortalecimento da soberania e da autodeterminação das nações.

Os sírios têm seus problemas internos, que nunca foram simples. É preciso reconhecer, com ênfase, que são contradições cuja resolução cabe apenas a eles como povo soberano. E a vitória contra a agressão estrangeira patrocinada pelos EUA pode simbolizar um passo importante na luta contra a agressividade imperialista e pela paz mundial.

sexta-feira, 27 de julho de 2012

Iluminados contratam Exército dos EUA para dar pitacos sobre o São Francisco



Segundo o gerente de concessões e projetos especiais da Codevasf, Roberto Strazer, o contrato tem o prazo de três anos e os engenheiros do Usace devem apresentar 12 projetos de assessoria técnica para a navegação do rio. "São estudos sobre dragagem, controle de erosão e estabilização das margens, geotecnia, dentre outros", disse.

O Usace foi criado em 1882 para atuação em desastres, como enchentes, terremotos e furacões, mas recentemente tem apoiado as ações militares no Iraque e Afeganistão. Dois engenheiros civis do órgão ficam permanentemente no Brasil, fazendo estudos e avaliações nas margens do rio, trabalhando de forma coordenada com militares e civis do Exército norte-americano em Washington.

Todos os chefes do Usace são militares, com a patente de general. No entanto, o gerente de projetos da Codevasf disse não ver riscos à segurança nacional em trabalhar com o Exército norte-americano. Roberto Strazer alegou que eles possuem um "conhecimento incrível" em navegação. "São técnicos e temos muito a ganhar com a parceria", acrescentou.

Na semana passada, o comandante do Comando Sul das Forças Armadas dos EUA, brigadeiro Douglas Fraser (que responde diretamente ao secretário de Defesa e ao presidente Barack Obama), esteve em Brasília para acompanhar o trabalho.

Fraser é graduado pela Academia da Força Aérea, como bacharel em Ciência Política, e pós-graduado pela Universidade de Auburn, com Mestrado em Ciência Política. Atualmente à frente do Comando Sul dos EUA, é responsável pelas ações do Departamento de Defesa nas 45 nações das Américas do Sul e Central e do Mar do Caribe, compreendendo uma área de 25 milhões de km2.

Segundo o professor Marcos Coimbra, membro do Conselho Diretor do Centro Brasileiro de Estudos Estratégicos (Cebres), titular da Academia Brasileira de Defesa e da Academia Nacional de Economia e Autor do livro Brasil Soberano, o contrato é "um absurdo inexplicável e imperdoável", em especial por tratar-se de um acordo entre um órgão do Ministério da Integração e um organismo estrangeiro, representado por um oficial general da mais alta patente das FFAA dos EUA.

"Esta aberração está sendo concretizada com o conhecimento da Presidência da República? O Congresso Nacional apreciou o assunto? E o Exército Brasileiro foi ignorado?", indagou Coimbra. O professor alertou que no local existe uma rica região mineral, questionando a justificativa de investigação geológica por estrangeiros na área.

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A Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), órgão subordinado ao Ministério da Integração, contratou o Corpo de Engenharia do Exército dos Estados Unidos (Usace) para estudar alternativas que tornem navegável o Rio São Francisco. O contrato, de R$ 7,8 milhões (US$ 3,84 milhões), foi assinado em dezembro do ano passado.

Dilma rejeita agressão à Síria e apoia as Malvinas argentinas

 

Presidenta expôs a posição brasileira durante encontro com o primeiro-ministro britânico
  
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Na reunião, Cameron também citou a situação do Irã e tentou obter apoio do Brasil para mais sanções contra Teerã. Uma vez mais, porém, Dilma rejeitou qualquer intervenção, alertando que o risco de um conflito regional teria um profundo impacto sobre os preços do petróleo e agravaria a crise econômica global. De acordo com Dilma, uma intervenção militar internacional na Síria ou no Irã prejudicaria os próprios esforços dos europeus para resgatar suas economias. A presidente defende o diálogo com Teerã e insiste que seu governo não apóia o uso de energia nuclear para fins que não sejam pacíficos.

A posição do Brasil, segundo Dilma, reflete a tentativa do país de seguir mediando uma negociação com o presidente iraniano, Mahmoud Ahmadinejad, sobre o enriquecimento de urânio, feita em parceria com a Turquia, em 2010. Ela reiterou que o diálogo é a única maneira de lidar com a situação do Irã. Segundo o ministro Antônio Patriota (Relações Exteriores), Dilma afirmou ainda a Cameron que o Brasil é solidário à Argentina na questão das Malvinas.

As Ilhas Malvinas estão ocupadas pela Inglaterra, mas a presidente Cristina Kirchner não aceita essa situação e reivindica a soberania de seu país sobre o arquipélago.

Os britânicos, sob orientação de Washington, estão pressionando o Conselho de Segurança da ONU para aprovar uma resolução que determine sanções contra o presidente sírio, Bashar al-Assad. Londres vem alardeando sua campanha de agressão e assumindo o papel que tradicionalmente é cumprido pelos EUA. Em campanha presidencial, o presidente americano, Barack Obama, tem evitado informar a verdade ao país sobre seus planos de intervenções militares, inclusive contra a Síria. No entanto, China e Rússia já disseram que não aceitam qualquer iniciativa nesse sentido e vêm minando as ações belicistas dos britânicos e dos americanos.

"A presidente disse que uma intervenção militar não vai solucionar a questão na Síria", explicou o ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota. "A militarização não funciona", acrescentou o chanceler brasileiro, após o encontro. O governo do Brasil também pediu um "cessar fogo urgente" e apoio ao plano de paz proposto pelo enviado especial da ONU à Síria, Kofi Annan.

Dilma chegou a Londres nesta quarta e não falou com a imprensa. A presidente veio para cidade inglesa participar da cerimônia de abertura dos Jogos Olímpicos de 2012 na sexta-feira, promover os Jogos de 2016 no Rio, e ter encontros políticos. Nesta sexta-feira (27) ela terá um encontro com o líder do Partido Trabalhista e da oposição, Ed Milliband.

A presidente ainda vai participar de um coquetel que a rainha Elizabeth 2ª oferecerá a chefes de Estado na sexta à tarde, antes da cerimônia de abertura dos jogos. Dilma também vai visitar o Museu de Ciências de Londres. Pelo menos seis ministros foram na comitiva da presidente, além do presidente da Câmara dos Deputados, Marco Maia (PT-RS).

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presidente Dilma Rousseff disse ao primeiro-ministro britânico, David Cameron, nesta quarta-feira (25), que o Brasil é contra uma intervenção militar estrangeira na Síria. A afirmação foi feita em uma reunião entre os dois chefes de governo, realizada em Londres. Dilma condenou a insistência dos ingleses e americanos em atacar militarmente a Síria. "O Brasil se preocupa que uma intervenção possa colocar a Síria em situações semelhantes às de Iraque e Afeganistão", destacou a presidenta.

Importações aumentam no ano e chegam a 110 bilhões de dólares

Taxa de câmbio melhora mas ainda é insuficiente

O resultado das contas externas em junho, divulgado pelo Banco Central (BC) na terça-feira, mostra vários problemas – e graves. O que parece mais estranho é o aumento das importações, apesar da relativa correção da taxa de câmbio que as subsidiavam barbaramente.

De janeiro a junho do ano passado - quando a cotação média do dólar foi R$ 1,63 – o valor total das importações atingiu US$ 105,3 bilhões. De janeiro a junho deste ano, com uma cotação média do dólar de R$ 1,87, as importações alcançaram US$ 110 bilhões, ou seja, quase US$ 5 bilhões a mais.

Esse aumento nas importações é o principal motivo dos declinantes saldos comerciais, pois as exportações permanecem mais ou menos no mesmo patamar – em junho o saldo foi apenas US$ 806 milhões para exportações de US$ 19,4 bilhões. Essa é uma questão secundária, ainda que seja uma pedra no sapato daqueles que querem apresentar os problemas atuais como resultado da crise dos países imperialistas (até agora eles não explicaram qual o mecanismo de transmissão dessa crise para dentro do país, já que as exportações não foram paralisadas).

O problema mais importante é por que as importações continuam ampliando sua participação no mercado interno do país, em detrimento das empresas nacionais, apesar da melhora na taxa de câmbio.

Primeiro, porque a desnacionalização da economia atingiu um grau muito perigoso e quanto mais empresas nacionais passam a ser filiais ou subsidiárias de multinacionais, mais as importações aumentam, pois essas empresas importam os componentes com que aqui montam os seus produtos (ou, como na área de serviços, uma das consequências da compra em massa das empresas brasileiras de tecnologia da informação – TI – é a transformação de empresas elaboradoras de softwares em balcão de venda para softwares importados).

Sinteticamente: as filiais de multinacionais fazem parte de uma cadeia produtiva externa. Além disso, as importações das filiais proporcionam ganhos financeiros às matrizes - não é por outra razão que a maior parte do comércio exterior das multinacionais é um comércio intrafirma, ou seja, entre a matriz e as filiais. Evidentemente, esses ganhos financeiros se dão à custa de espoliar os países onde estão instaladas as filiais.

Segundo, a destruição de elos das cadeias produtivas, promovida pela política do sr. Mantega no ano passado, foi tão violenta que boa parte das empresas nacionais não consegue mais adquirir insumos e bens intermediários dentro do país, pois eles deixaram de ser fabricados aqui – portanto, são obrigadas a importá-los. Um exemplo evidente é a produção de pigmentos para fabricação de tintas, que deixou de existir no Brasil. Somos agora grandes importadores de pigmentos da Índia...

Terceiro, a taxa de câmbio melhorou, mas ainda está subsidiando fortemente as importações contra a produção interna. Portanto, continua mais barato importar. Esta é a razão porque a Abimaq, no momento, faz campanha para que a cotação do dólar vá para R$ 2,50. Trata-se de algo que até o FMI, em seu recente relatório sobre o Brasil, não somente reconheceu, mas explicitou:

A taxa de câmbio [do real em relação ao dólar] caiu substancialmente este ano, mas permanece bem acima do nível médio de 2004-2008” (IMF, “Brazil: 2012 Article IV Consultation - Staff Report”, Washington, D.C., July 9, 2012, pág. 8).

Entre 2004 e 2008 a taxa de câmbio média, vis-à-vis o dólar, foi R$ 2,30 – a cotação do real em relação ao dólar estava, portanto, abaixo da atual, em que são necessários cerca de R$ 2 para comprar 1 dólar. Em 2004, esteve mais abaixo (US$ 1=R$ 2,92) e também em 2005 (US$ 1=R$ 2,43).

Na página seguinte do mesmo relatório do FMI está um gráfico, onde é mostrado que, mesmo o real tendo reduzido sua hipervalorização artificial em relação ao dólar em “quase 8,5% este ano e 25% em relação aos níveis de julho de 2011”, a taxa de câmbio permanece bem acima daquelas das moedas da África do Sul, Índia, México e Coreia do Sul, também em relação ao dólar.

Portanto, é forçoso reconhecer que a diminuição da hipervalorização do real – isto é, a passagem da taxa de câmbio da casa dos R$ 1,50 ou R$ 1,60 para a casa dos R$ 2,00 - ainda é muito insuficiente.

Logo, são meio desesperadas – ao modo daquelas trezenas ou novenas, com rezas obsessivas de terços, diante de uma situação aflitiva da vida – certas lamentações pela “falta de competitividade” da indústria nacional. Em que consiste a competitividade? A taxa de câmbio faz parte da competitividade – tanto quanto a proteção da indústria nacional pelo Estado nacional, o financiamento público das empresas nacionais e a prioridade para elas nas compras do governo.

É algo inútil falar que o problema é a “competitividade” porque “esgotou-se” o papel do consumo no estímulo ao crescimento, quando a “falta de demanda” é apontada por 34,5% das grandes empresas, 35,6% das médias empresas e 31,8% das pequenas empresas como um problema crucial, na recente pesquisa da Confederação Nacional da Indústria, num pulo de +8,5 pontos percentuais na menção ao problema pelas grandes empresas, desde o segundo trimestre de 2011 (cf. CNI, “Sondagem Industrial”, Ano 15, Nº 6, junho/2012, pág. 6).

O que isso quer dizer é, somente, que os níveis salariais muito baixos já são um obstáculo para a expansão da economia – e que a contenção dos salários, incentivada pelo governo, já está estrangulando o consumo em alguns setores. Só isto e nada além.

Segundo a pesquisa da CNI, “a indústria operou, em média, com 72% da capacidade instalada em junho” (CNI, loc. cit., pág. 4).

É difícil achar que o problema da indústria é falta de “competitividade” ou de “produtividade”, quando, em média, 28% da capacidade instalada já existente, está ociosa – ou por “falta de demanda” ou porque a demanda está sendo coberta por mercadorias importadas.

O investimento, sem dúvida, é muito baixo no Brasil – e enquanto o investimento público estiver travado, será impossível aumentar o investimento privado. Não é uma originalidade brasileira: qualquer país atualmente é assim.

Mas, a principal causa do baixo investimento é o privilégio ao setor financeiro - especulativo e parasitário - e às multinacionais, contra as empresas produtivas nacionais.

Por essa razão, certos gritos atuais, dos corifeus de bancos e monopólios estrangeiros, pelo investimento “porque o consumo estaria esgotado”, seriam ridículos, se não fosse a sinistra intenção de liquidar empresas nacionais e arrochar consumidores – isto é, o povo.

O presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (ABIMAQ), Luiz Aubert Neto, tem toda razão ao apontar que:

O fato é que todos os incentivos dados pelo governo, pelo menos até o momento, serviram para gerar empregos no exterior (...). … está claro que somente o incentivo ao consumo sem uma política industrial eficaz, não é garantia de encomendas no mercado interno. (…) o governo adota políticas pontuais sem atacar as questões estruturais. É preciso construir uma política industrial que, além de se preocupar com o consumo das famílias, também seja voltada à ampliação dos investimentos (…). Neste cenário a taxa de investimento mais uma vez ficará em torno dos inexpressivos 18% do PIB. Para se ter uma ideia o mundo investe, em média, 23% do PIB”.

Realmente, é um falso dilema se, para o crescimento, o mais importante é o investimento ou o consumo – até porque não parece provável que algum dia nasça um empresário que faça investimentos sem que haja consumo ou, pelo menos, expectativa de consumo.
CARLOS LOPES

Itaú lucra R$ 6,7 bi e demite

 

Por Altamiro Borges

No acumulado do primeiro semestre deste ano, o lucro líquido do banco Itaú totalizou R$ 6,730 bilhões. Na maior caradura, porém, a poderosa instituição financeira alardeia na mídia rentista que está em dificuldades - que teve queda de 5,6% nos seus lucros na comparação com o mesmo período de 2011. Esta é a desculpa esfarrapada para dispensar milhares de trabalhadores. Entre junho de 2011 e junho último, o Itaú demitiu 9.014 bancários - 8,8% do seu quadro funcional. Só no segundo trimestre deste ano foram 3.777 vítimas.


Com o amparo de alguns "especialistas" da imprensa - na verdade, porta-vozes do oligarquia financeira -, o banco alega que a queda "abrupta" da taxa de juros - seja da Selic, patrocinada pelo Banco Central, ou das instituição públicas, bancada pelo governo - prejudicou os seus negócios. O Itaú também joga a culpa nos clientes, difundindo que houve aumento da inadimplência decorrente do "crédito fácil". As duas desculpas também são esfarrapadas. Bravatas de banqueiros e dos seus "calunistas" da mídia.

Diante da queda da taxa de juros, que não teve nada de "abrupta" e continua das mais altas do mundo, os bancos elevaram suas taxas de serviços e passaram a ser mais seletivos. Já no que se refere à inadimplência, ela permaneceu praticamente estável - atingindo 5,2%, alta de 0,1 ponto percentual na comparação com o trimestre anterior e de 0,7 ponto em relação a igual período de 2011. Nada justifica o Itaú aniquilar tantos empregos e penalizar tantas famílias de trabalhadores - a não ser a gula por lucros estratosféricos.
http://altamiroborges.blogspot.com.br
“É inadmissível que um banco com esse resultado gigantesco, que não enfrenta nenhum problema, demita tantos trabalhadores, como também estão fazendo o Bradesco e o HSBC. É uma política socialmente irresponsável, que joga contra o desenvolvimento e os interesses do país”, afirma Carlos Cordeiro, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores no Sistema Financeiro (Contraf-CUT).

Obama: a política do faz de conta

As mais penosas feridas políticas foram auto-infligidas, a começar quando, mesmo antes de sua eleição, correu de volta a Washington para ajudar a resgatar o bailout de Bush e socorrer Wall Street. Essa foi, talvez, a primeira indicação real de que os luminosos discursos de campanha sobre mudanças sistêmicas e geradoras, mascaravam uma psique servil de um homem que ansiava desesperadamente para ser abraçado pelas elites financeiras e políticas
JEFFREY ST. CLAIR
               
              Produtos danificados, mande-os de volta
                Não posso trabalhar, não consigo, me devolva
                Abra a caixa registradora, me dê o troco
                Você prometeu me fazer bem
                Agora refinancie o custo
                Você disse que era barato, mas teu custo é muito alto
               

  (
De "Damaged Goods", Gang of Four)

Barack Obama estava em Brasília, a 19 de março de 2011, quando anunciou com alguma fanfarra a mais recente das guerras de sua jovem Presidência. O bombardeio da Líbia começara, com uma salva de ataques de mísseis de cruzeiro e bombardeios aéreos. Foi uma espécie de intervenção improvisada, largamente orquestrada por Hillary Clinton, Susan Rice e a diva da vingança, Samantha Power, sempre disposta a um bombardeio de saturação em nome dos direitos humanos.

Obama logo elevou o tom, sugerindo que chegara a hora de Kadafi ir embora. O Império perdera a paciência com o coronel. Os sinais da Guerra da Líbia passaram da agourenta "zona de exclusão aérea" para a busca por mudança de regime. Logo, os bombardeios passaram a ter como alvo Kadafi e sua família. Após o assassinato de Osama Bin Laden, em uma invasão de casa com sangue derramado, Kadafi, com razão, receava que Obama também quisesse seu corpo num saco de plástico.

Na ausência de protestos massivos contra a destruição em curso de Trípoli, coube ao Congresso tomar algumas medidas, tentando desafiar a última guerra desautorizada e não provocada. Em um momento anterior na história da República, o arrogante desafio de Obama ao Congresso e à Lei de Poderes de Guerra de 1973, poderia ter provocado uma crise constitucional. Mas estes são dias mais enfadonhos e mais modorrentos, nos quais tais questões vitais se limitaram a uma espécie de oco teatro político. Todos os atores, enfadonhamente, representam os seus papéis, mas todo mundo, até a audiência das TVs de notícias a cabo, percebe que é tudo apenas um show. As guerras vão seguir o seu curso. O Congresso irá financiá-las. O povo não terá voz nesta questão. Como ironizou Oscar Wilde: "O mundo todo é um palco, com um mau elenco".

Aquele velho mole, John Boehner, o lacrimoso filho de um dono de bar, esculpiu uma resolução, exigindo que Obama explicasse suas intenções na Líbia. Foi aprovada, por grande maioria. Uma resolução que competia com esta, do travesso Dennis Kucinich, pedia uma imediata retirada das tropas dos EUA. Esta medida radicalmente saudável conseguiu robustos 148 votos. Obama desprezou ambas as tentativas de botar abaixo a sua abordagem unilateralista quanto a operações militares, dizendo, com um leve toque de surrealismo, que as mais de 14.000 investidas aéreas sobre a Líbia não caracterizavam uma "guerra".

Este é o político moralista Barack Obama? O agente das mudanças? O acadêmico constitucionalista? Escutem essa voz. É petulante e desdenhosa. Alguns dirão que é rabugenta, como o gemido de um estudante talentoso que é apanhado colando numa prova final.

Sim, todos os atores políticos estavam fazendo suas partes. Mas qual o papel exato assumido por Obama?
Obama, o laureado com o Nobel, atribui a si o papel de um Novo Internacionalista, um chefe executivo de um império global, mais disposto a consultar os chefes de Estado da Europa do que os membros do Congresso, até mesmo os de seu próprio partido. De fato, seus cúmplices na surpreendente desventura na Líbia eram David Cameron e Nikolas Sarkozy, uma estranha troika, para dizer o mínimo. Até o próprio secretário de Defesa de Obama, Robert Gates, parece ter, discretamente, se desligado do circulo decisório.

Vocês têm visto o por quê de Obama faz acender uma reação tão virulenta nos mais histriônicos recintos da direita. Ele tem um majestoso senso de sua própria certeza. O presidente parece muitas vezes cativado pela nobreza de suas intenções, oferecendo-se como um tipo de salvador do Império Americano em erosão.

Enquanto vende idealismo imaculado às massas, Obama é, em seu cerne, um pragmático calculista, especialmente quando se trata de avançar em direção à suas próprias ambições. Obama não quer ficar manchado pela derrota. Essa é uma das razões pelas quais desistiu de pressionar por um Estado Palestino, depois que seu enviado ao Oriente Médio, George Mitchell, renunciou, frustrado. É por isso que Obama recusou a insistir em uma opção pública para sua atroz lei de Saúde. É por isso que retirou o apoio aos compromissos com o meio ambiente, à lei que facilitaria a organização sindical nas empresas e ao DREAM Act [projeto de lei que garante aos jovens imigrantes não legalizados, mas que tenham bons resultados escolares, atestados de residência nos EUA].

Obama assumiu a presidência em um momento no qual uma grande parte da nação parecia pronta a confrontar o desagradável fato de que o projeto americano havia descarrilado. Antes de morrer, Norman Mailer lamentava-se de que a cultura americana representava a corrosão de uma má consciência. O país estava se deformando sob o peso psíquico de anos de guerras ilegais, tortura, ganância oficial, excesso de pudor religioso, vigilância governamental, insatisfação sexual suplementada por Viagra, alimentos frágeis obtidos por engenharia genética, empregos sem consistência, filmes decepcionantes, e música corporatizada e infantil, tudo girando em torno de uma montagem de aborrecidas mensagens. Até a chamada comunidade virtual do espaço cibernético virou um solipsismo.

O capitalismo corporativo já não estava mais entregando seus produtos para ninguém. De qualquer forma, não para os 80% de baixo. A economia estava em ruínas, atolada no que parecia uma recessão permanente. O setor fabril fora morto de dentro para fora, com milhões de empregos extraditados e nada além de monótonas posições no setor de serviços em seu lugar. O desemprego crônico de longo prazo mantinha-se em mais de 10%, e, pior, muito pior, na América negra. Aqueles que se aferravam a seus empregos viram os seus salários estagnarem, o valor de suas casas se desvanecia e eram sufocados por impiedosas e crescentes dívidas. Enquanto isso, o capital se movia nos círculos cada vez mais apertados de uma nova e odiosa geração de super-ricos, que sem suor faziam bilhões com um fácil movimento de dinheiro.

Durante o ano de 2008, a melancolia parecia haver se decantado do espírito americano. O país tinha assistido seu governo incutir em seus próprios cidadãos o medo no futuro. A paranoia havia se tornado a indústria mais próspera. A paisagem política era ácida e malévola, o terreno perfeito para brotar o Tea Party e movimentos ainda mais fétidos e venenosos da direita americana. Esses não eram os descendentes ideológicos do fogoso Barry Goldwater. Os do Tea Party não tinham a inocência do Oeste e a ingenuidade de Goldwater. Esses populistas de bairros chiques eram, na maioria, brancos, infelizes e envelhecendo, animados por uma nostalgia lúgubre e sinistra de um suposto Éden preexistente, chamado Governo Reagan, muitos sentindo sua posição na sociedade escorregando inexoravelmente. Eles queriam seu país de volta. Mas, de volta de quem?
Ao invés de culpar as corporações que enviavam a produção para fora do país ou os banqueiros predadores, eles dirigiam seu impulso vingativo contra os negros e os imigrantes, servidores públicos, professores, cientistas e homossexuais. Há algo de profundamente patético nesse fatalismo político e nessa nova espécie de Sabe Nada ["Know Nothing": movimento chauvinista e racista nos EUA, em meados do século XIX]. Mas, deve ser dito, sua ira era, na maior parte, pura. Um estranho consórcio de descontentamento fundido com um senso indefinido de alienação, um desespero ácido com a diminuição das potencialidades da vida na América pós-industrial.
Não, esses não eram idealistas fanáticos ou mesmo utopistas pacifistas. Eram uma espécie alimentada pelo medo, conspirativistas com um apetite nixoniano para a destruição política. Empurrados ao frenesi pelo palavreado doido e cínico de Glenn Beck e Rush Limbaugh, os encontros de massa de adeptos do Tea Party durante o verão de 2009 mostravam sinais de uma psicopatia coletiva, como se a loucura enervante de décadas no confinamento das estufas dos subúrbios americanos tivesse finalmente irrompido, pela primeira vez, para que todos a vissem quantas vezes quisessem pelo Youtube, sob crescente mortificação. Exatamente ali, no National Mall, podia-se ouvir a peroração insípida de Michele Bachmann e o novo passado americano, estas almas perdidas e amargas que sentiam que sua cultura os havia deixado muito para trás.

Com sua disposição solar e sua atitude de Prospero [personagem shakespeareano de "A Tempestade"] para a mistificação, Obama parecia ser capaz de convertê-los ou, ao menos, passar por cima deles. Ao invés disso, lhes deram um chute no traseiro. Como?
Obama é um mestre da política de gesticulação, mas, tende a se encolher em praticamente qualquer batalha mais vigorosa, ainda que os ânimos e o público o apoiem. Seu instinto político o leva a buscar abrigo em cima do muro. Ele é um conciliador por reflexo. Mais para Rodney "daria tudo para todos nos darmos bem" King do que para Reverendo [Martin Luther] King. Mesmo quando confrontado por frágeis encenadores, como John Boehner e Eric Cantor, Obama tende a murchar.

Talvez, Obama jamais tenha se confrontado com tal nível de hostilidade tóxica. Afinal, ele viveu algo como uma vida de charme, a vida de uma criança-estrela, amparado e mimado, encorajado e adulado, desde a Indonésia até Harvard. Obama era a encarnação física e psicológica do novo multiculturalismo: magro, afável, seguro e não ameaçador. Sua ideologia política, vagamente liberal, permanecia opaca na essência. Ao invés de uma agenda abrangente, Obama lançava um medíocre patriotismo belicoso, enquanto proclamava uma América pós-racial e pós-partidária. Ao invés de mudança radical, Obama passou a oferecer, simplesmente, competência administrativa. Isto era interpretado pelos ferozes guerreiros da direita como falta de medida e arrogância e suas homilias vazias apenas serviam para exacerbar sua ira. A direita virulenta já havia definido o perfil de Obama e viram nele o alvo perfeito para seu animus agregado. E, ainda melhor, eles já haviam posto a mira em um inimigo tão inatamente avesso ao conflito que, mesmo quando alvejado por calúnias racistas, não bateria de volta.

Claro, as mais penosas feridas políticas foram auto-infligidas, a começar quando, mesmo antes de sua eleição, correu de volta a Washington para ajudar a resgatar o bailout de Bush e socorrer Wall Street. Essa foi, talvez, a primeira indicação real de que os luminosos discursos de campanha sobre mudanças sistêmicas e geradoras, mascaravam uma psique servil de um homem que ansiava desesperadamente para ser abraçado pelas elites financeiras e políticas. Ao invés de se encontrar com as vítimas dos predadores de Wall Street ou seus defensores, como Elizabeth Warren ou Ralph Nader, Obama abraçou-se ao cérebro confiável do Goldman Sachs e se envolveu em conversas amigáveis com o crème de la crème dos lobistas das corporações em K Street [avenida, em Washington, onde estão lotados os maiores escritórios de lobistas dos EUA]. Ao fim e ao cabo, Obama ajudou a salvar as empresas mais venais e corruptas de Wall Street, concordou em acoitar seus executivos, defendendo-os diante da promotoria para que não pagassem por seus crimes e, como era previsto, foi depois pago com o seu escárnio.

Portanto, a revolução de Obama terminou antes de começar, afogada pelo excessivo desejo do político de provar a si mesmo que era confiável aos grandalhões do establishment. Daí para frente, outras promessas, desde enfrentar as mudanças climáticas até fechar Guantánamo, desde acabar com a tortura até iniciar um sistema de Saúde nacionalizado. Promessas que se comprovaram ainda mais factíveis de serem quebradas.

Tomemos a questão que deu tanta vida à sua campanha: acabar a guerra no Iraque. Semanas depois de assumir, foi chamado por Robert Gates e pelo general David Petreaus - e retornou à Casa Branca magoado e humilhado. A retirada ia acontecer lentamente, mas uma força sinistra ficaria para trás indefinidamente, um contingente letal de cerca de 50 mil, entre operativos da CIA, unidades de forças especiais, esquadrões da morte e grupos de segurança privada sem limites. A guerra aberta de Bush, silenciosamente, se tornava uma guerra virtual; fora da visão, fora do pensamento.

No outono de 2009, até as mãos mais calejadas de Washington já estavam esgotadas de quão profundamente emaranhada a ocupação norte-americana do Afeganistão havia se tornado. Lá, o ritmo selvagem da guerra havia falhado. Muitas promessas quebradas, muitos casamentos bombardeados, muitos assassinatos, muitas crianças mortas e mutiladas, corrupção e covardia demais na satrápia fantoche de Cabul. A maré havia se voltado irrevogavelmente contra os EUA e sua política esquálida. Longe de ser ferido de forma terminal, o Talibã era agora mais forte do que havia sido em qualquer momento anterior, desde 2001. Mas ao invés de capitalizar essa mudança tectônica de sentimento, reduzindo as tropas americanas, Obama, em um complô cínico para provar sua disposição marcial, viajou a West Point e anunciou em um discurso sombrio que estava em conformidade com Petreaus, injetando mais forças no país e desencadeando uma nova campanha de operações letais que iriam localizar e alvejar suspeitos de ser insurgentes, ao longo da cordilheira ao Sul do Afeganistão e do Paquistão.

Naquela noite, Obama falou em uma cadência austera, interrompida com pausas imperiosas, como se para sugerir que ele, ao contrário do instável George W. Bush, estava desencadeando uma guerra no Afeganistão até a vitória. Mas ele sabia muito bem, assim como seu alto comando, incluindo até Stanley McChrystal e David Petreaus, que patentearam a estratégia da contra-insurgência. Não havia nada para vencer no Afeganistão. Naquele distante rincão do mundo, não havia nem padrões para medir o sucesso militar. Era para ser uma guerra punitiva, pura e simplesmente, desenhada para extrair o máximo de sangue possível, uma guerra obscena combatida principalmente por drones com controle remoto, atacando aldeias camponesas em assassinatos sem a menor discrição.

Depois de tudo, o movimento americano pela paz só pôde esbravejar um ultraje impotente. Mas enquanto as guerras de Obama se espalhavam, do Afeganistão ao Iraque, Paquistão, Iêmen, Somália e Líbia, sem levar em conta os trabalhadores católicos, os Quakers e alguns grupos feministas – as restantes luzes morais que ainda piscam na nação –, mesmo estes protestos vagos se dissiparam em lamentos sussurrados, murmúrios balbuciados de desilusão. Seria possível que a esquerda americana tivesse se extinguido, enquanto força política potente, e fosse necessária a eleição de Obama para prová-lo?

E o que restou dos seguidores das palavras de Obama, estes cruzados jovens que o viram iluminado pelo brilho sagrado de sua retórica etérea, e se uniram a ele no trabalho duro de campanha, com uma devoção quase religiosa? O que corria por suas mentes quando a neblina passou, para revelar que Obama estava implementando de forma disfarçada os traçados da política da Era Bush em tudo, desde a detenção de prisioneiros sem acusação formal?

De fato, as ilusões morrem dolorosamente, especialmente quando explodem atingidas por mísseis de cruzeiro.

Publicado originalmente em Counterpunch

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quinta-feira, 26 de julho de 2012

Paraíso fiscal e servidão dos pobres


Por Mauro Santayana, em seu blog:

O grande pensador britânico George E. Moore, que influenciou, entre outros, Bertrand Russell, e, por seu intermédio, Wittgenstein, buscou, como tantos filósofos, o amálgama entre a lógica e a ética. É provável que o tenha encontrado, ao afirmar que o fundamento de toda filosofia é o bom senso.

Qualquer pessoa dotada de razão é capaz de distinguir entre o bem e o mal, ao examinar determinada situação, a partir do senso comum. Sendo assim, sob qualquer exercício da inteligência, os grandes bancos do mundo não passam de quadrilhas de assaltantes. Não só assaltam isoladamente, mediante as taxas exacerbadas de juros e dos serviços que prestam, mas se associam a outros assaltantes para lesar os trabalhadores e os empreendedores honrados do mundo inteiro.

Os 50 maiores bancos do mundo, segundo os estudos da Tax Justice Network - da qual é um dos dirigentes o notável contabilista britânico Richard Murphy - são responsáveis pela transferência ilegal de 21 trilhões de dólares, em sua imensa maioria dos países em desenvolvimento, para os paraísos fiscais. A cifra é superior à soma do PIB dos Estados Unidos e do Japão. Trata-se de um duplo delito: o dinheiro, que poderia ser usado no desenvolvimento econômico interno, vai ser empregado na especulação financeira ou em investimentos nos países mais ricos do mundo, e são sonegados os impostos devidos aos estados nacionais. Trata-se de um assalto aos que, realmente, o produziram com o seu trabalho.

Os paraísos fiscais não acolhem apenas o dinheiro subtraído ao fisco, mas servem de bom refúgio aos recursos - empapados de sangue e marcados pelo sofrimento de milhões de famílias – procedentes do tráfico de drogas. Como se revelou recentemente, o HSBC admitiu ter servido para a lavagem de dinheiro das quadrilhas mexicanas de narcotráfico.

Os paraísos fiscais se multiplicaram, no mundo, a partir da deregulationanglo-americana dos anos 80, promovida por Reagan e Thatcher, com o objetivo de restaurar o processo de acumulação acelerada do capitalismo do fim do século 19. Embora já houvesse tais paraísos – e a Suíça é o mais antigo e o mais seguro deles – houve perversa competição entre governos de nações menores, com o objetivo de ganhar o máximo na guarda simbólica de tais valores, que não se transferem fisicamente para tais territórios.

Sem os bancos de presença internacional, não seria possível essa peregrinação de recursos ilícitos. Para escapar à vigilância das autoridades honradas de alguns países (porque elas existem), tais recursos virtuais costumam peregrinar, indo de Tóquio a Berlim, de Berlim a Cingapura, de Cingapura a Santiago em alguns minutos, para, em seguida, refugiar-se onde não possam ser localizados.

De acordo com o estudo, os três maiores bancos responsáveis pela evasão de recursos são a UBS (União de Bancos Suíços), o Crédit Suisse e o Goldman Sachs. Eles encabeçam a lista, mas nenhum dos bancos privados que operam internacionalmente se encontram limpos. Uns mais, outros menos, operam na criminalidade.

Não há povos que não sejam vítimas desse saqueio mundial. Conforme o levantamento, a evasão maior procede da China, com mais de um trilhão de dólares nos paraísos fiscais. E estamos em posição desconfortável. Os nossos sonegadores e prováveis integrantes de quadrilhas de narcotraficantes e de corruptos e concussionários, mantêm mais de 520 bilhões de dólares em tais “paraísos”.

Quando o então presidente Itamar Franco quis nomear um contador para o Banco Central, o mundo caiu sobre a sua cabeça. Itamar queria conhecer o conteúdo da chamada “caixa preta” da instituição. O principal denunciador dos paraísos fiscais, o contador Richard Murphy, atribui à fragilidade das leis que regem os sistemas contábeis dos grandes países a responsabilidade pelos crimes cometidos pelas grandes corporações, sobretudo as financeiras, contra os povos do mundo e, assim, pela brutal desigualdade social de nosso tempo.

Os bancos devem ter seus negócios expostos aos acionistas e clientes, e sob a fiscalização permanente das autoridades. Como se sabe, os sonegadores – entre eles, os bancos – operam com duas contabilidades, a real e outra para efeito público. Isso só é possível porque eles financiam as eleições, determinam como devem ser as leis, controlam os meios de informação e cooptam os formadores de opinião.

Se os cidadãos do mundo inteiro não se mobilizarem, o destino dos povos será aquele que parece esperar os gregos, os espanhóis, os sicilianos: nova e mais insidiosa servidão.

terça-feira, 24 de julho de 2012

Desindustrialização e Desnacionalização


 

O Brasil corre o risco de uma especialização regressiva na produção agropecuária e de minérios, acompanhada de uma contração do setor industrial e de atrofia de sua capacidade tecnológica de desenvolvimento, e de vir, assim, a se tornar uma mera plataforma de produção e de exportação das megaempresas multinacionais. A desindustrialização e a desnacionalização têm graves consequências para o Brasil e para a integração sulamericana. O artigo é de Samuel Pinheiro Guimarães.


1. A desindustrialização e a desnacionalização têm forte impacto sobre o desenvolvimento econômico e social brasileiro em geral e sobre temas como emprego e salários, violência urbana, tráfico e consumo de drogas e saúde da população.

2. A desindustrialização e a desnacionalização têm graves consequências para a integração sul-americana, a partir de sua base necessária que é o Mercosul, para a posição do Brasil no mundo e, em consequência, para sua política externa.

3. Um país com uma indústria atrasada e não-integrada é um país fraco econômica e politicamente; um país com sua economia desnacionalizada é um país com menor capacidade de fazer política econômica e de fazer política externa.

4. Algumas causas da desindustrialização são uma política cambial e monetária que resulta, na prática, na valorização do real que estimula as importações e prejudica as exportações; uma política comercial que não combate com firmeza o dumping de produtos importados, o baixíssimo preço e o subfaturamento das importações; a ausência de políticas firmes de conteúdo nacional em áreas estratégicas como motores. A questão da competitividade (sistema de transportes, educação, tributos, etc) como causa da desindustrialização é complexa, suas soluções são de longo prazo e, ainda que importantes, não evitariam o perigo que se corre, que é atual, urgente.

5. A crise internacional e as relações comerciais com a China têm profundo impacto sobre a desindustrialização da economia brasileira. De um lado, a concorrência dos produtos chineses de baixíssimo preço afeta não só as unidades produtivas instaladas como a possibilidade de instalação de novas unidades. De outro lado, a forte demanda chinesa por produtos primários torna os investimentos a agricultura e na mineração mais lucrativos e, ademais, sujeitos a menor competição quando comparados à indústria. A crise nas economias européia e americana afeta as exportações brasileiras para a Europa (e, portanto, a lucratividade das empresas) enquanto se reduz o comércio intra-firma de manufaturados com os Estados Unidos, que corresponde a parte importante da pauta de exportação.

6. A desindustrialização da economia pode ser aferida pela redução do valor relativo da produção da indústria como um todo ou de setores industriais específicos ou pelo aumento do percentual das importações no valor total do consumo interno de um bem industrial ou da indústria em seu conjunto.

7. Os argumentos que procuram demonstrar a existência de um processo de desindustrialização através dos índices de redução da participação dos produtos industriais na pauta de exportações ou de déficit comercial por setores não são suficientes. A redução da participação percentual dos produtos industriais na pauta pode resultar ou de aumento de preços internacionais dos produtos primários ou do aumento do seu volume exportado, sem que haja redução do valor ou do volume das exportações industriais que podem, inclusive, ter aumentado.

8. As causas da desnacionalização são a ausência de políticas de preferência pelo capital nacional, diferindo da situação dos países desenvolvidos e dos outros Brics que possuem políticas, principalmente em áreas de tecnologia sensível, que tem como beneficiárias exclusivas empresas de capital nacional; de uma política firme de compras governamentais (e.g. na área de computadores); de preferência ao capital nacional nos financiamentos com recursos públicos, recursos inclusive dos trabalhadores, como é o do BNDES.

9. A desnacionalização da economia ocorre quando se verifica uma participação percentual crescente de empresas estrangeiras na produção de determinado bem ou serviço específico, ou do setor industrial e de serviços como um todo ou na produção de outros setores, tais como na agricultura e na mineração.

10. 85% da população brasileira é urbana. Nas cidades, o emprego é necessariamente na indústria ou em serviços. Nas cidades não há agricultura, nem pecuária, nem mineração e, portanto, não há emprego nesses setores que possa ser urbano. Os próprios empregos nos serviços urbanos são profundamente vinculados à atividade industrial.

11. O desenvolvimento brasileiro significa o aproveitamento cada vez mais eficiente de seus recursos naturais, de sua mão-de-obra e de seu capital, o que depende da expansão e da integração física de seu mercado interno. A desindustrialização e a desnacionalização da economia tornam difícil este aproveitamento eficiente e, portanto, o desenvolvimento do país. Em situações de desindustrialização ou desnacionalização, o desenvolvimento, medido em termos de aumento do PIB, pode até ocorrer, mas a uma taxa inferior à que seria necessária para superar a situação de subdesenvolvimento e de pobreza em que ainda vivemos.

12. O desenvolvimento eficiente dos recursos do solo e do subsolo, através da melhor organização da agropecuária e da mineração, depende da utilização crescente de máquinas, equipamentos e veículos que são, necessariamente, ou produzidos pela indústria no país ou importados. Nenhuma colheitadeira é produzida numa fazenda, nenhuma máquina perfuradora é produzida em uma mina.

13. O desenvolvimento industrial eficiente significa a integração da cadeia produtiva, o que significa produzir no país todos os componentes ou insumos de um produto final, sempre que haja escala atual ou potencial para isto, ou pelo menos a maior parte dos componentes e, em especial, os mais estratégicos. Digo potencial, pois quando a Embraer foi criada, por exemplo, não havia escala nacional para a produção de aviões.

14. O desenvolvimento eficiente da mão-de-obra significa o aumento da capacidade produtiva do trabalho em relação à mesma unidade de capital. O aumento da produtividade do trabalho em decorrência da utilização de unidades de capital, de equipamentos, mais eficientes significa aumento da produtividade do capital e não do trabalho. O aumento de produtividade do trabalho se verifica pela capacitação técnica da mão de obra, a qual, com a mesma unidade de capital com as mesmas características técnicas, passa a produzir mais.

15. A desindustrialização significa a redução da possibilidade de aumento da produtividade da mão de obra em geral. Primeiro, porque a indústria é a atividade de maior produtividade, onde a produtividade mais cresce e de onde nasce a maioria das inovações que irão aumentar a produtividade nos outros setores. Em segundo lugar, porque a desindustrialização reduz a integração das cadeias produtivas e assim as possibilidades de aprendizado que decorrem da instalação e da operação de novas unidades de produção para preencher “lacunas” nas cadeias produtivas.

16. A desindustrialização corresponde também à perda de emprego potencial, já que o emprego utilizado para produzir os bens importados pelo Brasil ocorre em outro país, o emprego é gerado em outro país.

17. Tendo em vista o grande estoque de mão-de-obra desempregada e subempregada que existe no Brasil e sua residência nas cidades, a menor expansão do emprego decorrente da desindustrialização da economia contribui para maiores índices de criminalidade, de tráfico e consumo de drogas, de incidência de doenças e para maiores despesas do Estado com segurança e saúde.

18. A desnacionalização tem consequências importantes para o desenvolvimento tecnológico, para o grau de concorrência no mercado brasileiro e para o balanço de pagamentos do país.

19. O impacto da desnacionalização sobre o desenvolvimento e a capacidade tecnológica, que significa a capacidade de transformar conhecimento em patentes e em investimentos produtivos, decorre do fato de que as empresas estrangeiras que adquirem empresas brasileiras são, em geral, megaempresas multinacionais. Estas megaempresas já têm centros de pesquisa no exterior, em especial nos países de sua sede, o que leva muitas vezes ao fechamento dos laboratórios de pesquisa que existiam nas empresas por elas adquiridas no Brasil.

20. As empresas que desnacionalizam empresas brasileiras são, em geral, megaempresas multinacionais com muito maior capacidade financeira e, portanto, têm maior capacidade de concorrer no mercado, de adquirir concorrentes e de oligopolizar ou monopolizar mercados. Este “controle” do mercado resulta em lucros maiores e lucros maiores de empresas multinacionais significa remessas maiores para o exterior e redução da formação de capital no Brasil, isto é, da expansão da capacidade produtiva no Brasil, do desenvolvimento eficiente do capital.

21. A desnacionalização leva à desindustrialização. Muitas vezes as empresas multinacionais adquirem empresas no Brasil e integram a produção desta empresa na cadeia produtiva geral da empresa o que pode dificultar a instalação de empresas supridoras no território brasileiro ou mesmo levar ao desaparecimento das que existiam antes da aquisição.

22. O Brasil corre o risco simultâneo de uma especialização regressiva na produção agropecuária e de minérios, acompanhada de uma contração do setor industrial e de atrofia de sua capacidade tecnológica de desenvolvimento, e de vir, assim, a se tornar uma mera plataforma de produção e de exportação das megaempresas multinacionais, inerme objeto de suas estratégias globais.

Estrangeiros controlam 4 das 5 maiores redes de supermercados

O ranking de faturamento das redes de supermercados no Brasil, divulgados em boletim pela Associação Brasileira de Supermercados (Abras), revela que, das cinco maiores redes de supermercados instaladas no país, quatro pertencem ao capital estrangeiro.
A Companhia Brasileira de Distribuição (CBD) – que não é mais companhia brasileira depois de ser abocanhada por completo pelo grupo francês Casino - aparece no topo da lista com faturamento de R$ 52,7 bilhões em 2011, quase duas vezes o que a segunda colocada no ranking faturou.
Em segundo lugar, o grupo Carrefour, também francês, faturou no mercado varejista R$ 28,7 bilhões.
Em seguida, vem o norte americano Wal-Mart, que lucrou R$ 23,5 bilhões em 2011.
O grupo chileno Cencosud, que chegou no Brasil em 2007 após comprar o grupo sergipano G. Barbosa, adquiriu a rede Prezunic por R$ 875 milhões, maior rede do Rio de Janeiro no final de 2011. O grupo aparece em quarto lugar, com lucro de R$ 6,2 bilhões (sem contabilizar o lucro dos supermercados Prezunic, adquirido recentemente).
O quinto e único entre os cinco maiores grupos varejistas que ainda é brasileiro, a rede gaúcha Zafari, faturou no período R$ 2,9 bilhões.
O retrato sinaliza o ritmo absurdo em que prossegue a desnacionalização das empresas brasileiras e a concentração predatória do setor na mão de grupos estrangeiros, dando a eles alto poder, inclusive na imposição de preços.
Juntos, a CBD, Carrefour, Wall Mart e Cencosud faturaram R$ 111,1 bilhões, ou seja, 50,8% dos ganhos no setor em 2011. Somente o faturado pelas três maiores, representa o montante de R$ 100 bilhões.


LDO aumenta em 12% desfalque para pagamento de juros a bancos


São R$ 155.851.000.000,00 de recursos públicos

O problema da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), aprovada pelo Congresso para 2013 na terça-feira, está em seu segundo artigo:

Art. 2º A elaboração e a aprovação do Projeto de Lei Orçamentária de 2013, bem como a execução da respectiva Lei, deverão ser compatíveis com a obtenção da meta de superávit primário, para o setor público consolidado não financeiro de R$ 155.851.000.000,00 (cento e cinquenta e cinco bilhões e oitocentos e cinquenta e um milhões de reais)” (grifo nosso).

Resumindo: todas as despesas não-financeiras têm que se adaptar aos juros – é para locupletar bancos com dinheiro público a título de juros que serve o “superávit primário”. Ou, dito de outro modo, todas as despesas com o atendimento das necessidades do povo têm que obrigatoriamente (“deverão”) ser cortadas de antemão, pois R$ 155,851 bilhões já estão reservados para juros. Ou, ainda de modo mais claro: antes de qualquer outra coisa, R$ 155,851 bilhões deverão ser desviados das despesas não-financeiras para as despesas financeiras, isto é, desviados para os bancos.

Quais são as despesas não-financeiras? As com Saúde, Educação, Saneamento, Ciência e Tecnologia, Cultura, Defesa, Minas e Energia, Reforma Agrária, Combate à Fome, Transportes, Meio Ambiente, etc., etc., etc.

Por isso, o desvio é chamado “superávit primário”, pois despesas “primárias” são as despesas não-financeiras, que têm como fonte as receitas “primárias” (os impostos que o povo paga): assim, “superávit primário” quer dizer, exatamente, o que é cortado ou tirado (ou roubado) das despesas primárias e enviado para cobrir a despesa financeira, isto é, os juros – ou, o que é a mesma coisa, o que é desfalcado da receita de impostos, do dinheiro que o povo paga para sustentar o Estado.

Assim, que se danem, por exemplo, o “Toda Criança na Escola”,  o “Brasil Escolarizado”, e demais programas do Ministério da Educação.

Outra síntese: nada é cortado dos juros, ainda que seja um centavo para uma criança beber mais um mililitro de leite. Ao contrário, o leite, isto é, as outras despesas, é que são cortadas para pagar juros.

Que país pode viver eternamente sob esse tacão? Sobretudo quando isso é uma fraude neoliberal que o FMI impôs, sem nenhum fundamento econômico, exceto o de garantir que os bancos se apropriem do Orçamento, isto é, do dinheiro que o povo paga ao Estado para que este faça alguma coisa por ele.

No caso da LDO para 2013, esse desfalque “primário” foi aumentado em 12% - duas vezes e meia a inflação projetada para este ano. A redução da taxa básica, portanto, não melhorou em nada a situação do Estado, pois o governo está lançando títulos com juros maiores que ela. O que mostra que a conversa sobre a redução do rendimento da poupança para “possibilitar a redução dos juros” era reles vigarice.

O sr. Mantega quer “superávits primários” crescentes durante 10 anos, ou quanto tempo for necessário, para zerar o “déficit nominal” (a diferença entre o “superávit primário” e o que o governo realmente paga de juros, pois sempre paga muito mais que o “superávit” – em 2011, o “superávit primário” foi 128,71 bilhões e os juros, R$ 236,67 bilhões).

Não é por religião que Mantega prega tal idiotice – que ele sabe, perfeitamente, que é impossível. A única forma de acabar com o “déficit nominal” é diminuir cada vez mais o pagamento de juros e não aumentar o “superávit primário” - afinal, não é pagando mais juros que se paga menos juros.

Acabar com essa pouca vergonha em que roubo é chamado de “solidez fiscal” tem uma vantagem extra: evita que certos companheiros deem vexame em público, como aconteceu com o ministro Mercadante na Comissão de Educação do Senado.

Mercadante iniciou sua exposição respondendo a uma cobrança (inacreditavelmente justa) da senadora Kátia Abreu sobre as compras do MEC de livros importados – não somente a editora espanhola Santillana, segunda maior vendedora de livros ao MEC, mas outras, imprimem seus livros no exterior, quebrando a indústria gráfica nacional. Disse Mercadante: “não importamos livros. As editoras que vencem o concurso, às vezes, imprimem parte da sua edição fora do Brasil”. Muito interessante esse conceito do que é – aliás, do que não é – importação. Mas ele tomou providências para que “o papel para impressão seja feito nas gráficas brasileiras”. Papel feito em gráfica?

Apesar do MEC comprar 162 milhões de livros por ano, a indústria gráfica talvez não seja o seu forte. Em compensação, Mercadante esclareceu que entende de matemática (“... a gente começa muito cedo na vida pública e o pessoal não vai à aula de matemática, mas quem fez economia trabalha com os grandes agregados”).

Quase acreditamos que ele matou as aulas, não de matemática, mas de economia, pois, segundo disse, o governo não pode dar aumento decente aos funcionários porque, na crise, é o mercado interno que sustenta a economia. Uma descoberta interessante, segundo a qual os funcionários não fazem parte do mercado interno, e, provavelmente, aumentar os seus salários, em vez de expandir, diminui o mercado interno: “... em tempos de crise cabe ao governo garantir o emprego de quem não é servidor público e não tem estabilidade. (…) Não queremos que aconteça aqui o que está acontecendo na Europa. O reajuste que foi oferecido pelo governo ficará no limite da margem fiscal. (…) Porque isso é que mantém o emprego para quem não tem estabilidade, para quem não é servidor público. (…) O que mantém a produção do Brasil é muito mais o mercado interno do que qualquer outra variável”.

Além do mais, disse Mercadante, o aumento dos funcionários das universidades prejudica as criancinhas e a distribuição de renda (os funcionários, naturalmente, não têm filhos e não fazem parte da renda nacional): “... falei com o pessoal dos sindicatos docentes que precisam entender esta questão – e os funcionários das universidades também. (…) Como não posso tirar da universidade, porque estou dando para a universidade, eu tenho de tirar do ensino básico. Agora, eu nunca vi uma criança analfabeta ir ao MEC se manifestar para dizer: 'Eu preciso aprender a ler e a escrever'. (…) Se nós não resolvermos essas questões básicas, não vai ter distribuição de renda neste país”.

Professores mal pagos devem ser melhores para as crianças. Mas não se pense que a solução é pagar menos juros para ter mais dinheiro para a Educação: “Não, por favor! (…) A inflação do mês passado foi 0,05. Eu não sei qual será a do ano que vem ou daqui a dois, três anos. E o Banco Central vai aumentar os juros se a inflação tiver um choque externo, tiver uma pressão de demanda, porque é uma variável de regulação”.

Portanto, são os funcionários, e não o governo, com um arrocho salarial vergonhoso, que prejudicam as crianças: “Nós tivemos, em Minas Gerais, uma greve de 120 dias; estamos tendo na Bahia uma greve de três meses... Santa Catarina teve greve acho que uns 60 dias... Quem paga essa conta? O Tesouro paga: Prefeitura, o Governo do Estado, mas, principalmente, as crianças”.

Porém, a grande solução para o ensino universitário é gastar dinheiro mandando estudantes para o exterior: “O aluno tem um ano de curso, nove meses na sala de aula e três meses de estágio em empresa, e pode ir seis meses antes, se não tem proficiência na língua, para aprender o inglês e até oito meses, se é alemão, chinês, línguas mais complexas”.

Nove meses de aula e três meses de estágio, mais seis meses para aprender a língua – ao custo total de R$ 5 bilhões até 2015. Há cursos de línguas mais baratos. Porém, o ministro exigiu, quatro ou cinco vezes, que o Congresso descobrisse “fontes de financiamento” (“o Congresso tem que dizer como se financia”) para as verbas da Educação. Infelizmente, nenhum senador lembrou-o que o ministro da Educação é ele – que, diante das necessidades, tem que propor alguma coisa, pois é para isso que serve um ministro. Mas só foi capaz de uma única ideia: os royalties do pré-sal. Muito original.

CARLOS LOPES

FHC e as fraudes do Santander e HSBC

 

Por Mauro Santayana, em seu blog:

Entre outros legados de Fernando Henrique Cardoso, se encontra a desnacionalização de alguns bancos, estatais e privados. Os casos mais emblemáticos são o do Banco do Estado de São Paulo, o Banespa, e o do Bamerindus, então controlado pelo Sr. José Eduardo de Andrade Vieira. O banco estatal paulista foi vendido ao espanhol Santander por 7 bilhões de dólares. A importância era muito inferior aos seus ativos reais.

A venda do Bamerindus, na calada da noite, ao HSBC, ainda parece mais grave. O seu controlador fora ministro do governo Itamar Franco e um dos principais financiadores da campanha de Fernando Henrique à Presidência, de cujo governo também participou. Segundo se informou, na época, o HSBC pagou um dólar pelos ativos bons do Bamerindus, e o Banco Central assumiu os ativos duvidosos, ou seja, suas dívidas e seus créditos junto ao mercado.

O Santander se transformou hoje no instrumento de transferência de recursos brasileiros para a matriz espanhola. Associado, ali, aos interesses do governo, hoje acossado pela mais grave crise econômica e social do país das últimas décadas, o Santander sobrevive com a forte participação da sucursal brasileira, responsável por um quarto dos lucros obtidos em suas operações mundiais.

O HSBC foi denunciado, por um comitê do Senado norte-americano, de associação criminosa com os narcotraficantes do México e com fontes financiadoras dos militantes muçulmanos no Oriente Médio. De acordo com a denúncia, que os controladores do banco atribuem à negligência de seus executivos, o HSBC realiza a lavagem de dinheiro dos cartéis mexicanos da droga, e serve de apoio a um banco da Arábia Saudita ligado à Al Qaeda. É possível que esse mesmo envolvimento seja descoberto na Colômbia, com os traficantes de cocaína, e no Afeganistão, o maior produtor mundial da papoula, de onde se extrai o ópio que, refinado, produz a heroína.

O HSBC ( Hong-Kong and Shangai Banking Corporation) apesar do nome, é uma instituição britânica, fundada em 1865, em Londres, que continua a ser sede. De todos os negócios feitos pelo governo Fernando Henrique com bancos estrangeiros, este permanece o mais misterioso. Segundo se sabe, ele foi concluído pelo então Ministro Pedro Malan em viagem sigilosa a Londres, e fechado ali durante a noite. Só então, depois de concluída, a negociação foi divulgada no Brasil.

O novo escândalo se soma aos demais, e a cada dia cresce a pressão da opinião pública mundial a fim de que os governos façam uma devassa nos grandes bancos internacionais e imponham regras rigorosas para o seu funcionamento. Um apelo neste sentido está sendo divulgado pela internet
http://www.avaaz.org/po/bankers_behind_bars_f/?tfGaodb), e se espera que, nas próximas horas, ele atinja um milhão de assinaturas.