quarta-feira, 30 de novembro de 2011

LIBIA E OS CADÁVERES ILUSTRES



Na introdução à primeira parte deste artigo, escrevemos, sobre determinados indivíduos, abordados pelo autor, que "nem sempre sua atuação foi negativa, mas apenas porque, numa época sombria, e com muitos cegos perdidos no espaço e no tempo, quem tem meio olho já é alguma coisa".

Essa colocação, pensando bem, é inexata, para não dizer, errada. Primeiro porque nem meio olho essa gente possuía. No máximo, um olho pintado na testa. Parafraseando um humorista brasileiro, em terra de cego, quem tem um olho pintado na testa, está no circo – e era onde eles estavam, pontificando num picadeiro semi-anarquista, onde se teorizava o reinado das ongs como sucedâneo dos partidos e outras coisas que transformavam sua retórica, supostamente anti-corporativa, num engodo vazio. Não por acaso, bastou a Fundação Ford e assemelhadas – todas, conhecidas fachadas da CIA – implementarem sua "nova" política de financiarem "grupos de oposição", para que eles se rendessem.

Isso aconteceu bem antes da agressão à Líbia. A resistência do povo líbio, com a oposição desses elementos, apenas revelou a que esses "grupos" ou pseudo-intelectuais realmente se opunham.

C.L.

TONI SOLO

Ignacio Ramonet desinformou sobre a natureza dos acontecimentos de fevereiro em Bengazi. Não há evidencia confiável de que manifestantes pacíficos foram alvejados. Agora, as mais altas estimativas de mortos na Líbia, entre 17 de fevereiro e 19 de março, estão em torno de 250.

Ramonet errou porque tomou como fonte um notório veículo de propaganda da Otan, o jornal inglês "The Guardian", cuja cobertura internacional é tão cínica e distorcida quanto a de "El País" ou "Le Monde". Ramonet também confiou na Al Jazeera, do Qatar, agora com seu corpo editorial tomado por ex-funcionários das corporações que dominam a mídia nos países que compõem a Otan.

AS FALSIFICAÇÕES DE RAMONET


Não é tão estranho quanto parece que um supostamente radical, como Ignacio Ramonet, possa ignorar toda a história das intervenções imperialistas nos últimos 200 anos. Escrever, como fez então, que a Resolução 1973 da ONU era legal, legítima e desejável, leva o cinismo, a serviço do interesse próprio, ao extremo. Houve época em que Ramonet era extremamente orgulhoso por seu trabalho em promover o Forum Social Mundial. Este evento está completamente comprometido por suas ligações com financiadores das corporações.

Na Líbia, Ramonet, também desonestamente, indicou como fato algo que ele, com certeza, não sabia, destacadamente, que Muamar Kadafi ordenou o uso de extrema força contra pacíficos manifestantes. Esta indicação é pura propaganda, como é a sua seletiva citação do comentário de Muamar Kadafi na época. Para escrever, como Ignacio Ramonet então fez, que a Resolução 1973 da ONU era legal, legítima e desejável, é preciso levar o cinismo em interesse próprio aos mais extremos limites.

Até o ex-secretário de Defesa dos EUA, Robert Gates, já tinha apontado, corretamente, que colocar em vigor uma zona de exclusão aérea, necessariamente, envolveria uma agressão militar. Mas a Carta da ONU, especificamente, exclui a ação militar, exceto em legítima defesa. Daí a afirmação, contra os fatos, do presidente Obama de que os EUA não estavam em guerra com a Líbia. Está dito tudo sobre a legalidade nas Nações Unidas.

De qualquer forma, a Resolução 1973 apela para uma solução pacífica e negociada. Esta opção, proposta pelo governo da Líbia, pela União Africana e pelo bloco de países latino-americanos da ALBA, já havia sido rejeitada pelo renegados da Líbia. Eles rejeitaram as negociações baseando-se na força do apoio que estavam recebendo dos governos que muito cinicamente aprovaram a Resolução, sabendo que nem eles próprios, nem os renegados, tinham qualquer intenção de buscar uma solução pacífica.

Ramonet afirma que o cheque em branco da ONU para a intervenção era legítimo em termos de solidariedade democrática. Aqui nos deparamos com uma contradição fundamental da "esquerda" neocolonial internacional. Ignacio Ramonet, um crítico famoso do capitalismo das corporações, aceita, no final das contas, que a América do Norte e a Europa são compostos por democracias e explicitamente descreve a Jamahiriya Líbia como uma ditadura.

Porém, foi a Líbia que cuidadosamente economizou dezenas de bilhões de dólares e os usou de forma clara em benefício do povo líbio e de outros povos africanos. Por outro lado, são as apodrecidas e corruptas plutocracias da Europa e da América do Norte que sugaram seus povos para enriquecer uma fina elite corporativa de banqueiros vigaristas e para proteger seu sistema financeiro criminoso. A solidariedade democrática da qual Ramonet fala não é nada mais do que uma construção narcisista montada para justificar seu preconceito ideológico contra a Jamhiriya Líbia.

Concluir, como então fez Ignacio Ramonet, que a Resolução 1973 da ONU era de alguma forma desejável é pleno delírio e falsidade. Os termos da Resolução 1973 deixam questões em aberto para que os governos norte-americano e europeus possam dar qualquer interpretação a elas. Nenhum observador sério teria uma expectativa diferente do que a desenfreada aplicação da força em apoio ao putsch racista que lutava para se manter em Bengazi.

A este putsch faltava qualquer apoio popular no restante da Líbia. Como Achcar e Wallerstein, Ramonet ignorou a abundância de informações disponíveis que indicavam aqueles fatos que foram confirmados várias vezes desde 19 de março de 2011. A reputação de Ramonet é mais um ilustre cadáver a bordo da Nau dos Bobos, iluminada pelas chamas do genocídio perpetrado pela Otan em Zlitin, Tripoli, Sirte e Bani Walid.

ASHCAR – OPERATIVO DA GUERRA PSICOLÓGICA


Gilbert Achcar é talvez o mais flagrante caso de desonestidade e evidente colaboracionismo com a guerra psicológica da Otan contra o povo líbio. Com relação à Líbia, Immanuel Wallerstein acabou por se mostrar um imbecil, e, Ignacio Ramonet, antes de tudo, um bufão narcisista e farsante. Mas a posição de Gilbert Achcar é um cuidadoso cálculo político de absoluta má fé.

Achcar é professor de Estudos do Desenvolvimento e Relações Internacionais na School of Oriental and African Studies, do Britain’s Foreign and Colonial Office. Ele dá aulas na França e na Grã-Bretanha há mais de 30 anos. Somente os mais ingênuos acreditariam que Achcar não foi totalmente cooptado pelo ambiente em que vive. Suas observações sobre a Líbia demonstram a sua capitulação moral e intelectual como um apologista do colonialismo que excede as expectativas.

"A ideia de que as potências ocidentais estão intervindo na Líbia porque querem derrubar um regime hostil a seus interesses é simplesmente um disparate

Achcar continua a revelar-se como um apologista da Otan, citando, sem a menor vergonha, como fato categórico, os mais extremos e ridículos números sobre mortes de civis pelas forças do governo líbio, sem absolutamente nenhuma base em qualquer relatório ou investigação legítima: "estima-se que o número de pessoas mortas, no início de março, foi de 1.000 a 10.000, o último número fornecido pela Tribunal Penal Internacional, com as estimativas da oposição líbia variando de 6.000 a 8.000".

Somente um boneco [stooge] da Otan esperaria ser levado a sério ao citar o Tribunal Penal Internacional (TPI) como fonte confiável. Como se sabe, o TPI, quanto a esses números, foi completamente desacreditado, junto com sua outra mentira ridícula, sobre os estupros em massa das tropas do exército líbio sob o efeito de Viagra. O ilustre cadáver da reputação de Luis Moreno Campo, do TPI, ou seus restos desidratados, junta-se aos de Wallerstein, Ramonet e Achcar, e seus cúmplices, no funeral dos companheiros de viagem da Otan, a bordo da Nau dos Bobos, em chamas nas areias da Líbia.

Os fatos agora estabelecidos e aceitos por todos, exceto colaboradores da Otan como Gilbert Achcar, são de que as forças de segurança da Líbia não abriram fogo contra manifestantes desarmados. Respeitadas organizações de direitos humanos colocam o número de mortes entre 17 fevereiro e 19 de março em cerca de 250.

INTELECTUAIS E CONTRA-INTELIGÊNCIA


Nas décadas de 50 e 60, a CIA e suas co-irmãs gastaram uma grande quantidade de dinheiro e recursos para subornar intelectuais na Europa e na América do Norte. A história da revista Encounter e da carreira do poeta Stephen Spender na Grã-Bretanha são emblemáticas. Abundam outros exemplos. Seria tolice extrema pensar que as mesmas práticas não têm persistido e não se tornaram mais sofisticadas nos dias atuais.

Um exemplo da forma como a rede de contra-inteligência de colaboradores diretos e companheiros de viagem da Otan funciona, veio à luz em relação à Líbia. Um dos guardiões do dissenso permitido, o site espanhol Rebelión, colocou em lugar de destaque um artigo de Santiago Alba Rico. Como Achcar, Alba Rico é um acadêmico proeminente, um especialista no mundo árabe, nas melhores tradições do Orientalismo. Alba Rico demonstra que a crítica de Edward Said ao conceito de Orientalismo pode facilmente involuir sobre si mesma com fins de propaganda neocolonial.

No curso de seu artigo, Alba Rico escreve sobre a complexidade da situação, apenas para simplificar drasticamente a favor de seu ponto de vista. "Até a Otan está ciente dessa complexidade, como demonstra o fato - como Gilbert Achcar apontou – de que a Líbia foi bombardeada muito pouco, com o objetivo de alongar a guerra para tentar derrotar o regime sem realmente quebrá-lo". Pode-se imaginar Achcar e Alba Rico em lugares como Zliten, ou Sirte, dizendo aos parentes em luto dos mortos pela Otan que parem de chorar. "Afinal, você só foi bombardeado um pouco...".

Apenas um apologista sem vergonha da Otan tentaria alegar que a Líbia foi bombardeada "muito pouco". Aproveitando a dica, Alba Rico usa a cínica e grotesca falsificação de Achcar para pespegar a sua própria apologia do ataque colonialista contra a Líbia.

Neste ponto, é possível deixar as mentiras e hipocrisias desses colaboradores e companheiros de viagem da Otan e examinar suas reivindicações de padrões éticos e intelectuais.

Uma fonte de informação útil sobre o que realmente aconteceu na Líbia, muito acima dos relatórios da guerra psicológica de desinformação da Otan, foi Leonor Massanet. Alguém que trabalhou em Rebelión até muito recentemente, confirmou que Santiago Alba Rico estava, por trás do pano, envolvido no deliberado assassínio de caráter de Leonor Massanet. O objetivo de Alba Rico, no qual, até certo ponto, ele claramente foi bem sucedido, era desacreditar Leonor, porque seu relato plausível e verossímil dos acontecimentos na Líbia contradiziam sua própria, e completamente falsa, análise.

Quando alguém se depara com casos de pessoas sendo transformadas em não-pessoas ou sendo caluniadas dessa forma, esse alguém encontra o limite da discordância intelectual legítima. Para lá dessa fronteira estamos lidando com o abuso de poder para fins de contra-inteligência, para neutralizar a efetiva oposição. É certo que agora o mundo inteiro está uma vasta bagunça de conflitos de baixa intensidade e guerra direta.

As elites ocidentais estão determinadas a dominar os povos do mundo e os seus recursos naturais. As atividades dos companheiros de viagem da Otan, como Gilbert Achcar e Santiago Alba Rico, estão longe de ser inocentes ou casuais.
Aqui, somos confrontados com a realidade da completa hipocrisia das notícias ‘alternativas’ cooptadas e dos meios de comunicação. Todos eles pretendem fornecer informação factual confiável de vários pontos de vista. Todos eles estão infestados com um auto-respeito hipócrita por impostores que prontamente suprimem as visões de que não gostam. Leonor Massanet está longe de ser a única vítima desta manipulada, enganadora e perniciosa cultura de contra-inteligência.

A guerra psicológica é um componente vital da guerra total. Durante todos os anos 1980 e 1990 o setor das ONGs dos EUA e Europa foi sistematicamente cooptado pelos governos dos países da Otan para servir a seus objetivos de propaganda. Com efeito, eles são o braço suave extra-muros dos Ministérios do Exterior desses países e projetam de forma rotineira as políticas externas desses países. Uma realidade que tem sido fartamente documentada.

A invasão colonialista da Líbia demonstrou com absoluta clareza que o antiimperialismo efetivo – a exemplo da FSLN na Nicarágua ou o PSUV na Venezuela – estão sob ameaça tanto da direita quanto da "esquerda" neocolonial.

Os fatos em torno da Líbia demonstraram que esta "esquerda" neocolonial é capaz de qualquer infâmia.

". É muito raro que um agente da guerra psicológica da OTAN ponha para fora algo como isso. É evidente por si próprio que a visão de Ashcar é que é verdadeiramente disparatada, sugerindo que os regimes ocidentais intervieram na Líbia por qualquer outro motivo, senão o fato de que a Líbia bloqueava seus planos em várias frentes.

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