quarta-feira, 11 de maio de 2011

Representante do papa na Líbia: 'bombardeio da Otan é imoral'

Para Dom Martinelli, “a afirmação da coalizão de que bombardeia a Líbia por querer proteger os civis não corresponde à verdade porque provoca vítimas justamente entre os civis que alega proteger”

“Tenho o dever de afirmar que os bombardeios [da Otan contra a Líbia] são imorais”, afirmou o Vigário Apostólico de Trípoli, Dom Giovanni Innocenzo Martinelli, à agência de notícias do Vaticano, a Fides, na sexta-feira dia 6 de maio. Ele acrescentou estar surpreso com declarações feitas de que “deveria se ocupar apenas de questões espirituais” e que os bombardeios “foram autorizados pela ONU”. “Mas isso não significa que a ONU, a Otan ou a União Européia tenham a autoridade moral para decidir bombardear”, destacou.

“É claro que não quero interferir com a atividade política de ninguém, mas tenho o dever de declarar que os bombardeios são imorais”, reiterou o representante do Vaticano em Trípoli. Os bombardeios contra a população - cometidos pela Otan - “não são um ato ditado pela consciência civil e moral do Ocidente, ou mais em geral, da humanidade”, mas sim “um ato imoral”, assinalou.

Desde que tiveram início os confrontos na Líbia, e a Otan passou a bombardear em massa, tendo como álibi uma resolução supostamente para “proteger civis”, Dom Martinelli tem sido uma das vozes mais corajosas contra a intervenção. “A ONU decidiu fazer a guerra e não admitem mais o diálogo como meio para resolver as controvérsias.

Todos querem continuar a perseguir a solução pelas bombas. É uma coisa triste, terrível, mesmo porque não mudará nada. É uma derrota para a humanidade”, ele afirmou à Fides no dia 27 de abril. “Segunda-feira da Páscoa assistimos a um bombardeamento terrível em Trípoli, mas isso não impediu os fiéis de estarem presentes na igreja”.

No dia 28, o religioso relatou que “na noite passada, um forte bombardeio perto da igreja abalou a serenidade dos cidadãos inocentes”. “Como pode a ONU autorizar isso?”, questionou. “Fomos acordados repentinamente à meia-noite e meia por uma explosão terrível. Bem perto, talvez dois quilômetros”, acrescentou. “Aqui ao redor existem residências de famílias com crianças; as pessoas saíram às ruas em pânico”.

No dia 30 de abril, o representante do Vaticano condenou o ataque da Otan contra a residência de Kadafi. “Pergunto-me se é moral matar um chefe de Estado. Que direito temos de fazê-lo?”, questionou o religioso. “As bombas, por mais miradas que sejam, deixam sempre vítimas civis”, ele disse. “Esta manhã, diversas pessoas vieram aqui para denunciar que muitas localidades foram bombardeadas, provocando vítimas civis - atingiram Sirte, Zentan e Misrata”.

Para Dom Martinelli, “a afirmação da coalizão de países que bombardeiam a Líbia de querer proteger os civis de agressões não corresponde à verdade, porque estes bombardeamentos provocam vítimas justamente entre os civis que eles asseveram querer proteger”. “Antes de tudo, é preciso estabelecer o cessar-fogo”, ressaltou. Ele recordou que foi o Papa João Paulo II que restabeleceu as relações diplomáticas com a Líbia em 1997, quando o país estava sob embargo.

No dia 2 de maio, Dom Martinelli pediu que uma trégua fosse respeitada, após o assassinato do filho de Kadafi, Saif Al Arab, e de três netos do líder líbio - Saif, 2 anos; Cartago, 3 anos; e Mastura, 4 meses. O representante do Papa relatou que viu “a casa atingida por 4 mísseis da OTAN. Era uma residência civil situada em meio a outras.” “Acho que estão brincando com a vida dos civis. Recordo que nestes ataques também morreram crianças. Isto torna ainda mais difícil uma solução pacífica, porque fomenta o ódio. Ontem, em consequência deste ataque, pessoas incendiaram algumas embaixadas.

Volto a repetir que as bombas não resolvem problemas. Pergunto-me se não seja oportuno suspender os bombardeamentos pelo menos para respeitar a dor da família”, ressaltou. Kadafi escapou ileso.

No dia 3 de maio, o Vigário Apostólico relatou à agência Fides que “os apelos por uma trégua não foram ouvidos, nem mesmo os do Santo Padre”. Os aviões “sobrevoaram Trípoli toda noite, impedindo-nos de dormir”. Os aviões criam pânico entre a população, as crianças não dormem mais. “Ontem, fui ao funeral de Saif Al Arab”, registrou Dom Martinelli.

Kadafi não estava, mas lá estavam os maiores representantes do poder líbio, entre os quais alguns de seus filhos. “Visitei a casa bombardeada e fui acolhido com grande respeito, percebi ainda grande atenção por aquilo que o Santo Padre diz. O Santo Padre pediu uma trégua, mas não foi ouvido”, disse o Vigário-apostólico de Trípoli, que concluiu apelando a um cessar-fogo.                                                                                    A.P.
 

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