sexta-feira, 25 de março de 2011

Tombini expõe no Senado como derrubar a economia brasileira

Em descompasso com a presidenta, dirigente do BC diz que é preciso conter a “demanda aquecida” para segurar a “inflação prospectiva”

O atual presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, declarou na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado que “é preciso conter a demanda para segurar a inflação”. Segundo ele, “a resposta adequada à inflação requer moderação da atividade [econômica]. Existem indícios de descompasso entre oferta e demanda. É preciso suavizar a demanda”.

E disse mais: “os investimentos realizados no passado recente, não foram ainda capazes de equacionar o descompasso entre oferta e demanda decorrentes do aquecimento da economia em 2010”.

Como muitos leitores estão, naturalmente, desacostumados a esse esperanto pseudo-econômico, traduzimos: a procura de bens ou serviços pelos consumidores estaria acima, ou crescendo mais, do que a quantidade de bens e serviços disponíveis - ou do que a capacidade da economia para fornecê-los.

Portanto, os preços, isto é, a inflação estaria subindo devido à escassez de bens (ou à incapacidade de produzi-los e fornecê-los a curto prazo).

No entanto, a variação dos preços nos primeiros 15 dias de março, medida pelo IPCA-15, caiu em relação ao mesmo período do mês anterior (0,6% contra 0,97%). Considerando os últimos três meses, essa variação nos primeiros 15 dias aumentou apenas 0,33 pontos percentuais em relação a igual período do ano passado. E, nos últimos 12 meses, aumentou 0,05 pontos em relação aos 12 meses imediatamente anteriores (6,13% contra 6,08%).

Então, por que a atividade econômica teria que ser freada diante de alterações tão pequenas?

Mas Tombini esclareceu que não se importa com a inflação real, essa que os índices registram. O perigo, asseverou, está no “cenário prospectivo”, ou seja, na inflação que existirá daqui a nove meses. É essa que ele está combatendo agora, já com dois aumentos na taxa básica de juros, que já era a maior do mundo (aliás, mais do que o dobro da segunda do mundo), antes mesmo de completar quatro meses na presidência do Banco Central.

O BC, naturalmente, com a sua sabedoria neoliberal, já inventou a máquina do tempo, capaz de prever – e influenciar - todos os fatores econômicos e financeiros responsáveis pelos preços com nove meses de antecedência (inclusive o principal fator: a política econômica da presidente Dilma num futuro de quase um ano).

À parte essa ficção-científica de má qualidade, vejamos os “indícios de descompasso entre oferta e demanda” de que Tombini falou. Só é possível chegar a essa conclusão por uma análise do consumo e do investimento (isto é, dos gastos das empresas para ampliar a sua capacidade de produzir).

Não é muito difícil, pois no dia três de março o IBGE divulgou os resultados de 2010.

Por esses números, sabemos que o consumo das famílias cresceu 7% no ano passado, o consumo do governo cresceu 3,3%, enquanto os investimentos em máquinas, equipamentos e edificações para a produção - que compõem a “formação bruta de capital fixo” (FBCF) - cresceram 21,8%, fazendo a taxa de investimento (FBCF/PIB) aumentar de 16,9% para 18,4%, a segunda maior em 10 anos.

Portanto, se os investimentos estão crescendo nitidamente – e substancialmente - mais que o consumo, onde estão os “indícios de descompasso entre oferta e demanda”?

A presidente Dilma está com toda a razão quando, há alguns dias, declarou em entrevista ao jornal “Valor Econômico”: “não acho que a inflação no Brasil seja de demanda. Há alguns desequilíbrios em alguns setores, mas é inequívoco que houve nos últimos tempos um crescimento dos preços dos alimentos, que já reduziu. Teve aumento do preço do material escolar, dos transportes urbanos, que são sazonais. Há crescimento da inflação de serviços e isso temos que acompanhar. Mas o que não é possível é falar que o Brasil está crescendo além da sua capacidade e que, portanto, tem um crescimento pressionando a inflação. O mundo inteiro, na área dos emergentes, está passando por isso. Houve um processo de pressão inflacionária que tem componente ligado às commodities. Caso contrário, é aquela velha tese: tem que derrubar a economia brasileira”.

Exatamente. Essa é a tese do Tombini. Para derrubar a economia brasileira, ele saca um extraordinário aumento da inflação e “indícios de descompasso entre oferta e demanda” que não existem. O objetivo é tão evidente que esse tipo de mentira até pareceria coisa de criança, se não fosse tão trágico para o país: aumentar os juros outra vez e mantê-los acima do Himalaia.

Aliás, é uma confusão dos diabos o que ele diz sobre o aumento do preço das “commodities” (sobretudo alimentos e petróleo). A presidente havia, há algumas semanas, afirmado que esse aumento era consequência de um “choque de oferta”.

Um “choque adverso de oferta”, para os economistas, é algo externo à economia (como dizem alguns: “uma externalidade” que afeta os preços de certas mercadorias). Portanto, a presidenta estava frisando que os preços das “commodities” não aumentaram por procura excessiva, ou porque haja consumo excessivo de comida e de derivados do petróleo.

Tombini está e não está, ao mesmo tempo, de acordo. Segundo ele, a contenção da “demanda agregada” (isto é, conter a procura de bens e o consumo de toda a população) ajuda a evitar a “propagação de choques de oferta”.

Em outras palavras: já que o aumento do preço das commodities é resultado da especulação em Chicago e Nova Iorque, onde o BC não tem poder algum, deve-se “conter a demanda” das outras mercadorias, daquelas que não tiveram aumento de preços, nem foram objeto de especulação. E que se dane o povo e a economia – com preços mais caros impostos em alguns bens pelos especuladores externos e sem poder comprar, ou com dificuldade para comprar, os bens que não aumentaram de preço. Não é genial?

Mas ele não acha – apesar do próprio BC ter afirmado isso em seu Relatório de Inflação, além da FAO, da UNCTAD e até do FMI – que o aumento do preço das “commodities” é resultado da especulação. Segundo ele, é “fruto de uma demanda agregada maior do conjunto de várias economias, principalmente emergentes”, ou seja, a culpa é desses pobres que resolveram comprar comida demais.

Tombini também acha que os salários no Brasil estão excessivos, com essa mania dos trabalhadores quererem “reposições acima da inflação” e com essa leniência dos empresários em concedê-las. Disse, inclusive, que o mercado de trabalho está “muito aquecido”, isto é, tem gente demais empregada. Certamente, desse jeito, sem um batalhão de desempregados, os trabalhadores vão acabar conseguindo um salário decente...

Tombini, por sinal, é um sujeito com uma incrível falta de desconfiômetro. Sem se tocar que a política econômica em geral é função da presidente Dilma, deitou falação sobre o crédito, que “só deve crescer entre 10% e 15% no ano, pois se subir entre 15% e 20% parece acima do recomendado”. Recomendado por quem? E desde quando ele tem que dar palpite nessa questão?

Mas ele garantiu que a “política monetária” (isto é, o aumento de juros, pois essa é a única que ele pratica) “reduz o prêmio de risco, na distribuição de renda e na queda da dívida pública, além de trazer ganhos para o setor privado, que tem maior acesso ao mercado de crédito e com custo mais reduzido”.

Esse sujeito é maluco.

CARLOS LOPES

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