quarta-feira, 30 de março de 2011

Rússia condena bombardeios à Líbia e defende cessar-fogo

“Os relatos de ataques aéreos da coalizão contra tropas de Kadafi, e sobre o apoio a ações de insurgentes armados” estão em “clara contradição” com o “objetivo de proteger civis”, cobra a Rússia

“A interferência da coalizão no que é, essencialmente, uma guerra civil, não foi sancionada pela resolução do Conselho de Segurança da ONU”, afirmou o ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergey Lavrov, em condenação aos bombardeios contra a Líbia cometidos por EUA, França, Reino Unido e outros países. Desde 19 de março já foram executados 1602 ataques aéreos contra a Líbia, de acordo com a agência France Presse, 60% disso, pelos EUA. Com 3,5% das reservas de petróleo do mundo, a Líbia é um dos maiores abastecedores da Europa, e a China havia se tornado seu maior parceiro comercial.

“Os relatos – que ninguém nega – de ataques aéreos da coalizão contra colunas de tropas de Kadafi, e sobre o apoio a ações de insurgentes armados” estão em “clara contradição” com as declarações desses países de que “o único objetivo é a proteção dos civis”, ressaltou o chefe da diplomacia russa. Lavrov destacou que é necessário aprovar um “cessar-fogo imediato” na Líbia, e que a Rússia está apoiando a mediação oferecida pela União Africana na semana passada.

A Rússia se absteve na votação que aprovou a Resolução 1973, de “uma zona aérea de exclusão” sobre a Líbia supostamente para proteção de civis, junto com China, Brasil, Índia e Alemanha. Após o início dos ataques aéreos dos EUA e europeus – agora sob a legenda da Otan -, contra o país árabe, o primeiro-ministro russo, Vladimir Putin, afirmou que a resolução “mais parecia uma convocação medieval para uma cruzada”.

Já o enviado da Rússia junto à Otan, Dmitry Rogozin, advertiu que “qualquer operação militar estrangeira terrestre na Líbia será considerada ocupação do país”, segundo a agência de notícias Ria Novosti. A entrada de tropas estrangeiras terrestres na Líbia foi expressamente proibida na resolução 1973, mas Washington, Wall Street, a City londrina, Paris e outros buracos menos votados já estão dando tratos à bola sobre como dar o dito por não dito. Entre as idéias em consideração, há a cínica sugestão de considerar eventuais tropas estrangeiras terrestres como “escolta da ajuda humanitária”.

Não são apenas os russos que apontam as violações da resolução 1973 pela coalizão. Até mesmo Lord Ashdown, ex-alto representante da ONU para a Bósnia-Herzegovina, admitiu que o “contínuo apoio” às gangs do leste equivale a “apoiar mudança do regime, o que legalmente está além da resolução do CS”. Para evitarem chegar à mesma conclusão óbvia, outros juristas, ouvidos pelo jornal “Guardian”, recorreram aos mais diversos malabarismos.

Mas, como indagou um leitor do “Guardian” em comentário, se a aviação estrangeira está lá para “proteger os civis” de quem está dando tiro neles, porque a investida dos “rebeldes” contra Sirta não é bombardeada pela coalizão? A propósito, o correspondente do jornal, que está em Sirta, se viu forçado a reconhecer que a população local está com o líder Kadafi. Uma boa explicação – pelo menos de acordo com a rede de jornais McClatchy, dos EUA, que inclui o “Miami Herald” - é que o principal “chefe militar” dos “rebeldes” “viveu 20 anos na Virginia”. E bem perto da sede da CIA, que é pra não demorar a chegar ao serviço.

Questão semelhante foi apontada pelo porta-voz do governo líbio, Moussa Ibrahim. As gangs “estão avançando e ninguém os está parando”, apontou. E ninguém “nem mesmo está lhes dizendo, ‘onde vocês vão’ ou ‘por que vocês estão tomando posições ofensivas e atacando o exército líbio e as cidades líbias’”. Ibrahim denunciou que a Otan quer “matar de fome a população líbia para colocar a Líbia de joelhos e fazê-la pedir clemência”. Ele afirmou, ainda, que os civis líbios “estão sendo aterrorizados diariamente” pelos ataques aéreos estrangeiros. “Nós consideramos que a desnecessária continuação dos ataques aéreos é um plano para pôr o governo líbio em posição de negociação fraca.” Na segunda-feira, a televisão libia mostrou imagens de feridos em um hospital e de prédios destruídos. Civis ficaram feridos em bombardeio da Otan à cidade de Sabha nas primeiras horas da manhã. De acordo com o governo líbio, já foram mortos 114 líbios nos ataques aéreos, e 445 ficaram feridos.

SOLUÇÃO FINAL

Obama, por sua vez, foi à televisão no esforço de engrupir a população sobre a terceira guerra dos EUA por petróleo em uma década, O presidente Nobel da Paz asseverou que “não vai promover troca de regime”, pois isso é muito complicado e caro (US$ 1 trilhão), como visto no Iraque e Afeganistão. Mas, asseverou, enquanto existirem tropas de Kadafi vai haver “ameaça”, e então tem de continuar bombardeando. Obama incumbiu o governo inglês – que tem duas proposições para a Líbia, uma, matar Kadafi, a outra, derrubar seu regime, não necessariamente na mesma ordem – de encontrar uma “solução política” para a Líbia, no que será ajudado de perto por Sarkozy e a Chevron. Esta, aliás, havia deixado inesperadamente a Líbia em outubro, onde fazia prospecções desde 2005.

Como registrou outro leitor do “Guardian”, 40 países se reúnem em Londres para discutir “o futuro da Líbia” e nem mesmo o governo líbio é convidado. Se já não tivesse sido pendurado num poste, certamente Mussolini seria o presidente de honra do evento.
                                                                                                                                                                                         
                                                                                            

                                                                                            
ANTONIO PIMENTA

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