sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Pau que fica torto só o machado endireita
Mantega excreta um pacotaço para fazer crescimento recuar na porrada
Orçamento: menos 50 bi Contratações: nenhuma Salário: bem arrochado  Juros: o céu é o limite

Disse o ministro, ao anunciar o seu pacote, que cortar R$ 50 bilhões nos gastos públicos, cortar o repasse para o BNDES, aumentar os juros deste banco no financiamento ao investimento e diminuir o crescimento, será ótimo para o investimento e para o crescimento. Mantega diz que quer cortar o custeio – que é a maior parte do gasto público com o povo – para aumentar o investimento. Mas só anunciou cortes. Nenhum centavo a mais para os parcos investimentos orçamentários.

Pacote corta 50 bi de gastos com o povo e mantém gastos com bancos

Segundo o ministro, “todos os ministérios serão atingidos”, isso inclui educação, saúde, defesa...

No Brasil, já houve um presidente – foi na época da ditadura - que acabou com a lepra mudando o nome da doença. Já o ministro Mantega (uma vez que a palavra “ajuste” foi estigmatizada pela presidente Dilma durante a campanha eleitoral) acha que muda alguma coisa chamar arrocho fiscal de “consolidação” fiscal, ou golpear o crescimento chamando-o de “garantir o crescimento”, ou dizer que a inclusão das verbas do PAC no superávit primário (isto é, no desvio de dinheiro para pagar juros) é “não fazer corte no PAC”, ou que está “viabilizando um salário mínimo de R$ 545” - como se isso não fosse a viabilização do achatamento salarial.

O problema de fundo são as contas externas, problema inteiramente da responsabilidade de Mantega, ao abanar a ideia, desde que assumiu seu posto atual, de que era possível um “desenvolvimentismo” (aliás, um “social-desenvolvimentismo”) baseado na compra de empresas brasileiras por empresas estrangeiras, isto é, no “investimento direto estrangeiro” (IDE). Evidentemente, isso serviu para aumentar as importações (filiais de multinacionais são importadoras de componentes para montagem) e as remessas de lucros (pois é para isso que as multinacionais instalam filiais – mais ainda em época de crise).

Bastou crescer um pouco para que esse problema se manifestasse com rara intensidade. Agora, com as contas externas em perigo, a solução de Mantega é dar uma freada no crescimento – e não usar os instrumentos financeiros de que o Estado dispõe para aumentar o grau de nacionalização da economia. Pelo contrário, ele anunciou a diminuição dos repasses do Tesouro ao BNDES e a elevação dos juros deste banco público no financiamento de investimentos das empresas.

Diz Mantega que “nós estaremos revertendo todos os estímulos que fizemos para a economia brasileira entre 2009 e 2010. (…) nós já estamos retirando esses incentivos e agora falta uma parte deles que estão sendo retirados do Orçamento 2011, que são os gastos públicos, que ajudaram a estimular a demanda”.

O motivo, segundo ele, é que a crise internacional passou – não se sabe aonde, mas, de qualquer forma, como lembrou o vice-presidente da Associação de Funcionários do BNDES (AFBNDES), economista Hélio Pires da Silveira, “desde Kalecki e Keynes” (e até antes deles), se sabe que com crise ou sem crise, “a demanda e, consequentemente, a renda, dependem do investimento e dos gastos do governo” - ou seja, dos investimentos públicos e das despesas correntes do governo, isto é, do custeio.

Porém, Mantega parece ter aderido aos caducos Gudin/Campos/Fernando Henrique. Vejam essa pérola: “nós vamos fazer uma forte redução de gastos de custeio (…) e ao mesmo tempo exigir o aumento da eficiência do gasto. Significa você com menos recursos realizar as mesmas ou mais atividades do que se realizava. A própria escassez de recursos para os Ministérios vai obrigá-los a fazer que o dinheiro renda mais”.

Não é uma nova versão do cavalo do inglês, estimado leitor. Mantega está dizendo que o Estado não precisa gastar com o povo os recursos que recebe deste mesmo povo – num país em que, como apontou a nossa presidente, é urgente erradicar a miséria.

O custeio é a maior parte do gasto público com o povo – e é uma consequência do investimento. Não existe investimento que não provoque aumento do custeio, isto é, das despesas para que o resultado do investimento funcione – a única possibilidade em contrário é se o investimento for em algo absolutamente inútil, mas aí o ministro estará jogando dinheiro no lixo e não “aumentando a eficiência do gasto”.

Mantega quer cortar essas despesas com o povo, mas não tem a mesma opinião sobre as despesas com os bancos. Segundo ele, “este ajuste [a palavra deve ter escapado], esta consolidação fiscal, possibilitará que nós alcancemos o superávit primário (…). Cabe à União quase R$ 81,8 bilhões”.

Portanto, ele não vê problemas em que o governo reserve, só para juros, R$ 81,8 bilhões, isto é, o dobro dos investimentos orçamentários destinados ao PAC (R$ 40,15 bilhões). Ao contrário, acha isso um mérito, enquanto propõe que o salário mínimo real seja congelado. De acordo com o ministro, na hipótese de que as receitas sejam maiores que as estimadas, o governo tem outras opções além de gastar – aumentar o superávit primário.

Mantega diz que quer “aumentar o investimento cortando o custeio”. Então, por que, em seu pacote, cortou R$ 50 bilhões, mas não aumentou em um centavo os R$ 170,8 bilhões previstos para investimento total no orçamento de 2011?

Nessas horas o gato costuma deixar o rabo de fora: acabou a lenga-lenga de que os cortes nos gastos públicos seriam para reduzir os juros. Mantega disse: “isso abre caminho para que o Banco Central, quando for o momento, não necessariamente agora, evidentemente, quando for oportuno, poderá fazer a redução dos juros”.

Não é para reduzir os juros que esse pacote foi anunciado. Seu objetivo é golpear o crescimento. Só isso e nada mais.

Assim, disse Mantega que, com o corte de R$ 50 bilhões no Orçamento, quer alcançar um crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de 5% em 2011, “um nível alto de crescimento para a economia brasileira”.

Em suma, ele quer abater o crescimento de 7,5% para 5% (ou menos; antes, falara em 5,5%). Há quatro anos, o então presidente Lula devolveu a Mantega a primeira versão do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) porque o plano do ministro não garantia um “mínimo” de 5% de crescimento. Depois de receber um sabão de Lula (“não quero saber de desculpa”), Mantega concordou que 5% era o mínimo que o país havia de crescer. Mas agora ele redescobriu que 5% “é um nível alto para a economia brasileira”.

De lá para cá, o ministro parece ter aderido à velha tese neoliberal do PIB potencial – segundo o Banco Central, o país não pode crescer mais do que 4,5% (antes de Lula, era 3,5%). Se crescermos mais, os ganhos fáceis da especulação podem ser perturbados... Mantega já chegou em 5%. Falta pouco para os 4,5%.

Aliás, já que falamos no salário mínimo, é inteiramente falso que o salário mínimo tem que ser R$ 545 por causa do “impacto nos gastos da Previdência”. O ministro sabe perfeitamente que no seu pior ano (2009), a Seguridade Social, da qual faz parte a Previdência, teve um superávit de R$ 32,6 bilhões; que em 2008 o superávit foi de R$ 40 bilhões; em 2007, R$ 60,9 bilhões; em 2006, R$ 50,8 bilhões; em 2005, R$ 62 bilhões. Cálculos de auditores fiscais mostram que as contas da Seguridade suportariam um aumento do mínimo até para R$ 660. O ministro também sabe que a arrecadação de 2010 foi a maior da História – e, portanto, o superávit da Seguridade foi maior. Quanto ao salário mínimo de R$ 580, não há problema nas contas da Previdência, exceto diminuir desvios para os bancos.

Quanto à sua quase choradeira sobre a queda da arrecadação em 2011, deveria se informar com seu subordinado, o secretário da Receita Federal, Carlos Alberto Barreto, que há alguns dias (20 de janeiro) avaliou que a arrecadação de 2011 deverá ficar 10% acima daquela de 2010.

Mantega disse sobre a correção da tabela do Imposto de Renda, que ela “depende do salário mínimo”. Não acreditamos que ele queira dizer que a correção da tabela – uma medida apenas de justiça, pois o que está havendo é um sequestro de salários - depende de que as Centrais Sindicais aceitem um valor indecente para o salário mínimo.

Presente na entrevista coletiva junto com Mantega, a ministra do Planejamento, Miriam Belchior, anunciou uma série de medidas que inclui a suspensão da nomeação de funcionários já concursados e da realização de novos concursos.

VALDO ALBUQUERQUE

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