terça-feira, 14 de setembro de 2010

EMPRESA DE VERÔNICAS SERRA E DANTAS VIOLOU SIGILOS EM 2001

A “Decidir.com” abriu os dados de 60 milhões de brasileiros durante 20 dias

Quando acusou Dilma, sem nenhuma
prova, de quebrar o sigilo de sua filha, Serra sabia perfeitamente que aquela que descreveu como uma esforçada heroína do trabalho, sustentando a prole a duras penas, era culpada pela maior quebra de sigilo que já houve no país.

A matéria “Sinais trocados”, de Leandro Fortes, na Carta Capital desta semana, lança luz sobre esse submundo. Verônica Serra era sócia de Verônica Dantas, irmã e biombo de Daniel Dantas, numa empresa de nome “Decidir.com”, registrada em Miami (cf. HP, 24/09/2002). Fortes relata que:

“[Em janeiro de 2001], por cerca de 20 dias, os dados de quase 60 milhões de correntistas brasileiros haviam ficado expostos à visitação pública na internet. (…) graças ao passe livre da Decidir.com, era possível a qualquer um acessar não só os dados bancários de todos os brasileiros com conta corrente ativa, mas também o Cadastro de Emitentes de Cheques sem Fundos (CCF), a chamada ‘lista negra’ do BC” (grifo nosso).

Como a “Decidir.com” obteve esse “passe livre”?

“... a empresa das duas Verônicas conseguiu acesso aos dados (…) a partir de um convênio com o Banco do Brasil, sob a presidência do tucano Paolo Zaghen”.

AUTORIDADE

Qual a autoridade dos sócios da “Decidir.com” para obterem, através do BB, um cadastro sigiloso do Banco Central que não é fornecido nem à Serasa - que verifica a inadimplência e outras informações a partir de dados fornecidos por cada banco?

Mas o crime era claro e de dimensões colossais: “o uso do CCF do Banco Central é disciplinado pela Resolução 1.682 do Conselho Monetário Nacional, que proíbe divulgação de dados a terceiros. A divulgação das informações também é caracterizada como quebra de sigilo bancário pela Lei nÚ 4.595”.

O escândalo estourou em janeiro de 2001, quando a “Folha de S. Paulo”, jornal de que Serra foi editorialista, omitiu os nomes de Verônica S. e Verônica D., facilmente legíveis no site da “Decidir.com”, e, com base nessa quebra de sigilo, acusou deputados de passar cheques sem fundos (cf. FSP 30/01/2001 e FSP 31/01/2001 – matérias assinadas por Wladimir Gramacho).

A “Decidir.com” tinha como principal “investidor” nos EUA (segundo Verônica S.) um fundo do Citibank, o CVC (Citibank Venture Capital), pai do notório CVC Opportunity, este com sede nas Cayman, operado oficialmente pelo biombo de Dantas e sócia de Verônica S. - a senhora Verônica D.

Naturalmente, a “Decidir.com” só poderia ser viável no Brasil, no ultra-lucrativo ramo de “checagem de crédito, verificação de identidade e processamento de pagamentos”, se tirasse do caminho a empresa que faz esse serviço no país, a Serasa. Para o Citibank, Dantas e Serra, um grande negócio.

Mas a Serasa, em 2001, pertencia aos bancos brasileiros, alguns com voz de mando na “Folha”. Assim, as matérias da “Folha”, além de esconder Serra e Dantas, foram sob medida para enfurecer parlamentares – e alguns tucanos, inclusive Fernando Henrique e dois de seus ministros, Pedro Parente e Aloysio Nunes Ferreira, que tiveram o sigilo quebrado pela “Folha” através do site da “Decidir.com”.

Isso mandou para o espaço a “Decidir.com”, que fechou no Brasil poucos meses depois da reação dos deputados – com processos e um pedido de explicações do presidente da Câmara, Michel Temer, ao presidente do BC, Armínio Fraga. A “Folha”, então, decretou o abafamento completo – há nove anos ela não publica uma linha sobre o assunto. Agora, que a extensão do escândalo apareceu, ignorou a matéria de Leandro Fortes, preferindo os escândalos pré-fabricados de Serra, que, mesmo pré-fabricados, são microscópicos perto deste escândalo real.

Dantas e Serra (pode ser, é até provável, que a ideia tenha sido do primeiro, com a colaboração do segundo), tudo indica, armaram uma operação com o Citibank, usando o Banco do Brasil e o Banco Central, para substituir a Serasa, que pertencia aos bancos internos. Sem isso, o negócio da “Decidir.com” não teria sentido algum.

Que autoridade tinha Verônica Serra para uma operação desse porte, envolvendo o Banco do Brasil – e um cadastro sigiloso do Banco Central? A de ser filha de quem é – como, aliás, em todos os seus intrincados negócios.

Por pouco não temos um “serasa” nas mãos de Dantas e de Serra. Mas, depois disso, o sistema financeiro externo preferiu comprar a Serasa – adquirida em 2007 pelo grupo Experian.

Apesar do crime, e do pedido da própria Câmara, ninguém tomou providência alguma. Nem o BC - que teve um cadastro sigiloso roubado, mas que era chefiado pelo tucano Armínio Fraga; nem a PF - que tinha como diretor o tucano Agílio Monteiro Filho; muito menos Fernando Henrique, que teve o sigilo quebrado. Não foi porque desconhecessem o crime – mas porque conheciam os criminosos. Mas o presidente do BB que forneceu o cadastro do BC à “Decidir.com” foi demitido abruptamente um mês e meio depois - por Fernando Henrique.

O outro negócio da “Decidir.com”, como noticiamos em 2002, era definido alegremente em seu site: “encontre em nossa base de licitações a oportunidade certa para se tornar um fornecedor do Estado”.

A filha de Serra, ministro da área em que, então, as licitações eram mais numerosas (Saúde) estava associada à irmã de Dantas para oferecer “oportunidades” em licitações a quem quisesse ser “fornecedor do Estado”. Serra hoje acusa familiares de autoridades por suposto lobby. Mas nenhum desses acusados chegou nem perto da desinibição de sua filha. Mas o que fazia ela ser tão desinibida no oferecimento de tais “oportunidades” no Brasil?

Leandro Fortes lembra que, aqui, “a Decidir.com foi basicamente financiada pelo Banco Opportunity [i.é, por Daniel Dantas] com um capital de 5 milhões de dólares. Em seguida, transferiu-se, com o nome de Decidir International Limited, para o escritório do Ctco Building, em Road Town, Ilha de Tortola, nas Ilhas Virgens Britânicas, famoso paraíso fiscal no Caribe. De lá, a Decidir.com internalizou 10 milhões de reais em ações da empresa no Brasil, que funcionava no escritório da própria Verônica S”.

VIDRO

O que fica claro na matéria de Fortes é que Serra acusa os outros conscientemente daquilo que ele próprio faz também conscientemente. Não se trata de uma projeção, como algumas pessoas bondosas já aventaram. Para ele, a política é uma cafua subterrânea e trevosa onde somente se pode vencer pelo golpe – o que não deixa de ser uma confissão involuntária da própria mediocridade.

Ciente de que tinha esse descomunal telhado de vidro, Serra atirou pedras em telhados que não são de vidro. Se achou que assim não notariam o seu, ou se estava julgando os outros pela única medida que conhece - por si mesmo – não é importante, por serem os dois verdadeiros. Mas é algo que, quando não destrói os outros, torna-se autodestrutivo. Basta ver a campanha atual – sem nenhum desdouro para os méritos de Dilma.

CARLOS LOPES

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