segunda-feira, 14 de junho de 2010

O GOLPE ARTEIRO À ESPREITA

TERÇA-FEIRA, 8 de junho, escrevi a Reflexão "No limiar da tragédia" em horas do meio-dia, mais tarde vi o programa televisivo "Mesa-Redonda" de Randy Alonso, que se divulga normalmente às 18h30.

Nesse dia, destacados e prestigiosos intelectuais cubanos que participavam da Mesa, perante as agudas perguntas do diretor, responderam com eloquentes palavras que respeitavam grandemente minhas opiniões, mas que não acreditavam que haveria razão para que o Irã recusasse a possível decisão — já conhecida — que adotaria o Conselho de Segurança na manhã de 9 de junho, em Nova Iorque — sem dúvida alguma combinada entre os líderes das cinco potências com direito ao veto: os Estados Unidos, a Inglaterra e a França, com os da Rússia e da China.

Nesse instante, expressei às pessoas próximas que costumam acompanhar-me: "Lamento imenso não ter podido finalizar minha Reflexão expressando que ninguém desejava mais que eu estar enganado!", mas era já tarde, não podia retrasar seu envio ao site CubaDebate e ao jornal Granma.

No dia seguinte, às 10h, conhecendo que essa era a hora da reunião, pensei em sintonizar a CNN em espanhol, que com certeza daria notícias do debate no Conselho de Segurança. Pude assim escutar as palavras com que o presidente do Conselho apresentava um projeto de resolução, promovido dias antes pelos Estados Unidos, apoiado pela França, Grã-Bretanha e Alemanha.

Falaram também vários representantes dos principais membros envolvidos no projeto. A representante dos Estados Unidos explicou por que seu país aprovava isso, com o pretexto já sabido de sancionar o Irã por ter violado os princípios do Tratado de Não-Proliferação Nuclear. Por sua vez, o representante da Turquia, um de cujos navios foi vítima do brutal ataque das forças elites de Israel, que transportadas em helicópteros assaltaram na madrugada de 31 de maio a frotilha que levava alimentos para o milhão e meio de palestinos sitiados num fragmento de sua própria Pátria, manifestou a intenção de seu governo de se opor a novas sanções ao Irã.

A CNN, no espaço que dispunha para notícias, apresentou várias imagens de mãos erguidas, na medida em que expressavam com gestos visíveis sua posição, entre elas, a do representante do Líbano, país que se absteve durante a votação.

A presença serena dos membros do Conselho de Segurança que votaram contra a Resolução se expressou com a direita firme de uma mão de mulher, a representante do Brasil, que tinha exposto antes com tom seguro as razões pelas quais sua Pátria se opunha ao acordo.

Faltava ainda um monte de notícias sobre o tema; sintonizei a Telesur, que durante horas satisfez a incontável necessidade de informação.
O presidente Lula da Silva expressou na cidade de Natal, ao nordeste do país, duas frases lapidárias: que as sanções aprovadas eram impostas por "aqueles que acreditam na força e não no diálogo", e que a reunião do Conselho de Segurança "poderia ter servido para discutir o desarme dos que têm armas atômicas".

Nada de raro teria que tanto Israel quanto os Estados Unidos e seus estreitos aliados com direito ao veto no Conselho de Segurança, França e Grã-Bretanha, queiram aproveitar o enorme interesse que desperta o Mundial de Futebol para tranquilizar a opinião internacional, indignada pela criminosa conduta das tropas elites israelenses na Faixa de Gaza.

É, portanto, muito provável que o golpe arteiro se dilate algumas semanas, e inclusive, seja esquecido pela maioria das pessoas nos dias mais calorosos do verão boreal. Haveria que observar o cinismo com que os líderes israelenses responderão as entrevistas de imprensa nos próximos dias, onde serão bombardeados com perguntas. Oportunamente, eles irão elevando o rigor de suas exigências antes de apertar o gatilho. Anseiam repetir a história de Mossadegh em 1953, ou levar o Irã à idade de pedra, uma ameaça da qual gosta o poderoso império em seus tratos com o Paquistão.

O ódio do Estado de Israel contra os palestinos é tal, que não hesitaria em enviar o milhão e meio de homens, mulheres e crianças desse país aos crematórios nos que foram exterminados pelos nazistas milhões de judeus de todas as idades.

A suástica do Führer pareceria ser hoje a bandeira de Israel. Esta opinião não nasce do ódio, mas sim do sentimento dum país que se solidarizou e prestou albergue aos judeus quando nos dias difíceis da Segunda Guerra Mundial, o governo pró-ianque de Batista tentou enviar de retorno à Europa um navio carregado deles, que escapavam da França, Bélgica e Holanda, por causa da perseguição nazista.

Conheci muitos membros da inúmera comunidade judaica radicada em Cuba, quando triunfou a Revolução; visitei-os e falei com eles várias vezes. Nunca os expulsamos de nosso país. As diferenças com muitos deles surgiram por ocasião das leis revolucionárias que afetaram interesses econômicos e, por outro lado, a sociedade de consumo atraia muitos, frente aos sacrifícios que implicava a Revolução. Outros permaneceram em nossa Pátria e, prestaram valiosos serviços a Cuba.

Uma etapa nova e tenebrosa abre-se para o mundo.

Ontem, às 0h44 falou Obama sobre o acordo do Conselho de Segurança.

Eis algumas notas do que expressou o presidente, tomadas da CNN em espanhol.

"Hoje, o Conselho de Segurança da ONU votou por maioria a favor de uma sanção contra o Irã por seus repetidos descumprimentos…".

"Esta resolução é a sanção mais forte que enfrenta o governo iraniano e envia uma mensagem inequívoca sobre o compromisso da comunidade internacional de frear a expansão das armas nucleares."
"Por anos, o governo iraniano descumpriu suas obrigações recolhidas no Tratado de Não-Proliferação Nuclear."

"Enquanto os líderes iranianos se escondem por trás de retórica, suas ações os comprometeram".

"De fato, quando tomei posse há 16 meses, a intransigência iraniana era forte".

"Oferecemos-lhes perspectivas dum melhor futuro se cumpria suas obrigações internacionais".

"Aqui não há duplo padrão".

"O Irã violou suas obrigações sob as resoluções do Conselho de Segurança para suspender o enriquecimento de urânio".

"Por isso, estas medidas tão severas".

"São as mais rigorosas que tenha enfrentado o Irã".

"Isto demonstra a visão partilhada de que no Oriente Médio a ninguém convêm desenvolver estas armas".

Estas frases que selecionei de seu breve discurso são mais que suficientes para demonstrar quão fraca, débil e injustificável é a política do poderoso império.

O próprio Obama admitiu em seu discurso na universidade islâmica de Al-Azhar, no Cairo, que "em meio da Guerra Fria, os Estados Unidos desempenharam um papel na derrubada dum governo iraniano eleito democraticamente", apesar de que não disse quando nem com que propósitos. É possível que nem sequer se lembrasse como o levaram a cabo contra Mossadegh em 1953, para instalar no governo a dinastia de Reza Pahlevi, o xá do Irã, ao qual armaram até os dentes, como seu principal gendarme nessa região do Oriente Médio, onde o sátrapa acumulou uma imensa fortuna, derivada das riquezas petroleiras desse país.

Naquela época o Estado de Israel não possuía uma só arma nuclear. O império tinha um enorme e incontrastável poder nuclear. Então, os Estados Unidos pensaram na arriscada ideia de criar em Israel um gendarme no Oriente Médio, que hoje ameaça uma parte considerável da população mundial e é capaz de atuar com a independência e o fanatismo que o caracterizam.

Fidel Castro Ruz
10 de junho de 2010
11h59.




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