sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Sardenberg culpa usuários pelo tele-caos: “eles estão usando a rede cada vez mais”


Quem não conhece a folha corrida do elemento, poderia concluir que há um doido na presidência da Anatel. Antes fosse. O sr. Ronaldo Sardenberg, que, como ministro da Ciência e Tecnologia de Fernando Henrique, foi notável apenas pelo horror à expressão “tecnologia nacional”, continua o mesmo.
Há alguns dias, disse ele na Telebrasil – a associação das teles – que “as empresas estrangeiras precisam ser boas cidadãs”. Disse mais: “façam aqui o que vocês fazem em seus países”. A Telefónica deve ter adorado. Seus assaltos aos usuários na Espanha – e na Áustria, Itália, República Tcheca, Eslováquia, Inglaterra e Irlanda - são tão brutais que lhe renderam, até agora, 1 trilhão, 20 bilhões e 800 milhões de euros em multas, cujo pagamento a companhia tenta protelar, em intermináveis querelas judiciais.
No Brasil, o responsável pelas multas é a Anatel. Seu presidente fez questão de esclarecer às teles que a agência é “um órgão vinculado, mas não subordinado ao governo”. Isto é, não está subordinado a quem foi eleito pelo povo para governar.
Muito interessante, também, é a entrevista de Sardenberg, realizada pela repórter Miriam Aquino, do TeleSíntese. Diz Sardenberg que, ao assumir o atual cargo, ficou “chocado ao notar que na Anatel não havia um certo rumo” e por isso mandou confeccionar o Plano Geral de Regulamentação das Telecomunicações (PGR), que ele descreve como “um esforço técnico notável”.
Diante da observação - aliás, precisa - da repórter de que o PGR “parece que não tem rumo”, Sardenberg diz que “é assim o setor”. Resumindo: o rumo de Sardenberg não tem rumo porque o setor é assim mesmo: “’por exemplo”, diz ele, há um crescimento muito acelerado do tráfego, maior até do que o crescimento do setor como um todo. (….) As pessoas estão usando a rede cada vez mais”.
Ou seja, o caos na Internet não é porque as teles, que tomaram companhias estatais rentáveis com dinheiro do BNDES, não investiram na expansão e eficiência da rede, mas porque as pessoas a estão usando demais. A culpa não é do monopólio privado das teles, que arrancam o couro dos usuários. A culpa, pelo contrário, é dos usuários, da população.
Está para nascer o entreguista, o serviçal, que tenha alguma originalidade. Faz parte da natureza dessa súcia que eles apenas sejam capazes de repetir o que diz o patrão. Sardenberg repetiu, literalmente, o que disse o presidente da Telefónica depois da sexta pane de seu serviço de banda larga: a culpa é dos usuários, que trafegam demais na Internet. Então, por que as teles venderam a eles o serviço – e com toneladas de propaganda enganosa?

TRADIÇÃO

Diz Sardenberg que “a tradição da Anatel era ouvir as empresas”. Todo mundo sabia disso. Só não sabíamos que era uma “tradição”. Mas, nos esclarece Sardenberg, “tinha que ser assim mesmo, pois era preciso trazer os investimentos para o Brasil”. Que investimentos? Os do BNDES? Desde quando é função da Anatel, em vez de regular, de fiscalizar os serviços de telecomunicações, “trazer os investimentos para o Brasil”? Se foi isso o que a Anatel andou fazendo, melhor seria fechá-la imediatamente, pois esses investimentos nunca apareceram. Pelo contrário, o que apareceu foi uma pilhagem estúpida sobre a população e sobre o dinheiro público – e a remessa desarvorada desses recursos para fora do país. O que a Anatel realmente fez foi acoitar essa depletação monstruosa de recursos do país.
Porém, diz Sardenberg, as coisas agora vão mudar. A Anatel não vai mais ouvir só as empresas: “Vamos fazer uma pesquisa para auferir a satisfação do usuário”.
Muito legal. Qual será o resultado dessa pesquisa? Nós nem imaginamos. É capaz dos usuários estarem tão felizes com os serviços das teles, que o Sardenberg não vai aguentar o peso das homenagens.
Por fim, Sardenberg diz que a decisão da Anatel de sabotar a compra de equipamentos com tecnologia nacional para WiMax (transmissão sem fio para distâncias maiores), tecnologia na qual o governo, através do MCT, está investindo alguns bilhões, é porque “o órgão de Estado tem obrigação de ser neutro. Não é chegar e comprar de empresa nacional. É fazer demanda às firmas que apresentem propostas sobre uma determinada tecnologia, e aí se encomenda a produção futura. É assim que se faz. Esse é o método aceito internacionalmente”.
Em suma, ser neutro é fazer lobby pelos produtos das multinacionais e impedir a compra dos produtos com tecnologia nacional. Onde está a polícia que não bota na cadeia os adeptos desses “métodos aceitos internacionalmente”?
CARLOS LOPES

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