sábado, 6 de junho de 2009

Com ações a US$ 0,27 GM vai para o paraíso

Com ações a US$ 0,27 GM vai para o paraíso
A GM “reinventada” e “enxuta” começa com o fechamento de 12 fábricas e de 2600 revendas; além de 21 mil demissões e estoque de 92 dias de produção e queda nas vendas de 30% em maio
O Símbolo da potência industrial dos EUA, e agora ex-maior grupo industrial do mundo, ex-maior montadora do planeta e ex-“tudo que é o bom para a GM é bom para o país”, a General Motors iniciou sua nova fase, de bancarrota, com brilhantes declarações de seu CEO, Mr. Fritz Henderson, sobre o “momento histórico” e, no caso do Brasil, um alvissareiro anúncio da filial. Mas, com uma dívida assumida de US$ 173 bilhões, e ações entre US$ 0,27 e US$ 0,56, o Capítulo 11 da Lei de Falências é quase o paraíso para a “nova empresa”, “enxuta e altamente competitiva”. Ou pelo menos, o purgatório: em abril de 2000, as ações da GM haviam sido catapultadas a US$ 94,62.
O “Financial Times”, do alto da experiência da oligarquia inglesa, com Madame Thatcher, em vender sua indústria automobilística aos estrangeiros, detonar sindicatos e arrochar salários, para se concentrar no rentismo e na especulação com commodities e derivativos, ironizou a situação. “Se você dissesse a um americano 50 anos atrás que mais carros seriam vendidos na ‘China Vermelha’ do que nos EUA e que a GM quebraria e seria salva por dinheiro do governo em boa parte emprestado de Pequim, ele questionaria sua sanidade”, registrou o porta-voz da City londrina. (Aliás, se você acrescentasse que a GM venderia uma divisão, a Hummer, para uma empresa chinesa, Sichuan Tengzhong, como anunciado na quarta-feira dia 3, aí certamente seria declarado doido varrido pelo bom e bem centrado americano).
DESINDUSTRIALIZAÇÃO
Mas, ironias à parte, o colapso de agora é a continuidade da opção pela desindustrialização, que já foi visto em outros setores da economia dos EUA, e seu colateral, o arrocho do mercado interno dos EUA – a asfixia de sua tão cantada em prosa e verso “classe média” -, com o salário real sem crescer desde a década de 70.
A outra face, acelerada transfusão de renda para magnatas e executivos, e corte de impostos dos ricos. Enquanto assaltava os mercados externos, a GM viu murchar sua parcela do mercado interno de veículos, que chegou a ser 54%, e agora diz que, com a “reinvenção”, irá ficar em 20%. Na década de 90, foi às compras, adquiriu de Ford II um arranha-céu em Detroit, a falida Saab sueca, a sul-coreana Daewoo e mais algumas ofertas de ocasião. Agora, já vendeu até a Opel, adquirida dos alemães na bacia das almas em 1929, e procura comprador para outras divisões em desgraça.
Desde as denúncias de Ralph Nader na década de 60 sobre a insegurança dos carros que a GM fabricava, ao filme de Michael Moore “Roger and Me” (1989), passando pelo avanço (anos 70) dos importados japoneses e europeus no mercado norte-americano de veículos, muito já foi dito sobre a decadência da corporação. Mas embora o colapso da GM tenha se tornado questão de tempo com a implosão da bolha especulativa de Wall Street em 2008, sua crise já estava escancarada desde 2004, quando emergiram os prejuízos. Aquele ano em que a ofensiva da Resistência iraquiana inviabilizou o plano de Cheney e W. Bush de uma invasão paga com petróleo iraquiano, o Federal Reserve precisou subir os juros, acabou a gasolina baratinha, e todo o modelo de sobrevivência no seu próprio mercado com utilitários de luxo e beber-rões de gasolina foi por água abaixo.
Aquele ano também em que o então presidente do Goldman Sachs, Henry Paulson (depois secretário do Tesouro de W. Bush) foi ao Fed, e obteve, o fim de qualquer limite para a “alavancagem”, isto é, o liberou-geral para a bolha dos derivativos, hipotecas, cartões de crédito, e tudo mais que pudesse ser carteado e apostado. (“Tranchado” e “securiti-zado”, os CEOs gostavam de dizer). Computados apenas os anos de 2007 e 2008, o prejuízo da GM atingiu inacreditáveis US$ 70 bilhões.
REDUÇÃO
Assim, a “reinvenção da GM” começa com o fechamento de 12 fábricas e 2600 revendas; 21 mil demissões; e estoque de 92 dias de produção. 60% do capital em mãos do governo dos EUA (que já injetou lá US$ 20 bilhões e vai entrar com mais US$ 30 bilhões). 12,5% com o governo do Canadá e da província de Ontário, em troca da manutenção no país das fábricas e de 16% da produção total da GM na América do Norte. O que levou deputados republicanos a apelarem para o trocadilho infame de “Government Motors”. Meia dúzia de grandes bancos obteve 10% do controle acionário em troca do lixo tóxico que detinham. Já os trabalhadores, acusados de serem uma ameaça à sobrevivência da GM por quererem manter minimamente seus direitos, e que já haviam, no acordo coletivo de 2007, aberto mão de mais da metade do que a corporação lhes devia em seguro-saúde e aposentadorias, acabaram ficando com 17,5%. Inicialmente, era previsto 39,5%. O acordo com o governo do Canadá já prevê datas para a devolução das ações aos bancos, e, de acordo com o CEO Henderson, Obama lhe assegurou que não quer se envolver “na administração”. Mas vai precisar “reiventar” bastante: a queda da GM na venda de carros em maio foi de 30%.
ANTONIO PIMENTA

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