domingo, 1 de fevereiro de 2009

OPERAÇÃO VERDADE HÁ MEIO SÉCULO


Primeira grande batalha contra a desinformação
Juan Marrero
QUANDO ainda era um bebê, quase ao nascer, a Revolução Cubana teve que travar sua primeira grande batalha contra a desinformação e a calúnia.

O pretexto utilizado foram os julgamentos e condenações dos tribunais revolucionários dos mais notórios criminosos de guerra da ditadura de Batista, derrubada em 1º de janeiro de 1959. Mal haviam começado a ser cumpridas as decisões dos tribunais, levantou-se no exterior o fantasma de que os barbudos da Serra Maestra estavam fazendo um "banho de sangue" no país, pois faziam "execuções em massa".

De Washington, saíram as primeiras vozes de condenação à nascente Revolução. Wayne Hays, deputado democrata, disse: "Vou perguntar ao Departamento de Estado que vai fazer para acalmar Fidel Castro antes que Cuba se despovoe..." e em seguida propunha algumas medidas, entre as quais, a de bloquear os créditos a Cuba e suspender as importações de açúcar. Stanley Bridges, deputado republicano, declarou: "As notícias de Havana são pouco tranquilizadoras". Homer E. Capehart, senador por Indiana, era muito mais áspero em suas declarações: "A onda de mortes pelos rebeldes enlouquecidos pela vingança provoca náuseas aos cidadãos decentes".
Jornais dos EUA, da Grã-Bretanha e de outros países seguiam essa instrução saída do Capitólio de Washington. E, em seus editoriais, qualificavam de "desconsoladoras as notícias procedentes de Cuba", como o fez o Herald Tribune, e o Daily Sketch, de Londres, qualificou os acontecimentos de "espantoso capítulo".

Os assassinatos e torturas de Batista e de seus mais fiéis servidores foram muito bem conhecidos depois do triunfo da Revolução. A censura impediu que antes fossem tornados públicos. Do terror estabelecido se escreveram dezenas de milhares de páginas no último meio século.

A imprensa tradicional cubana, não tocada nos albores da Revolução, reproduzia as insidiosas notícias da AP e da UPI e as reportagens da Life, do Time e de outras publicações. Também contribuía a aumentar o fogo da campanha da mídia quando publicavam dramáticas fotos ou transmitiam nos noticiários da TV o desenvolvimento dos julgamentos e dos fuzilamentos dos criminosos de guerra, como nos casos de Olayón e de Cornelio Rojas. A imprensa internacional utilizava essas imagens para tentar enfraquecer a Revolução e apresentá-la como incivilizada, e um país governado por uma tribo de selvagens.
Chegou um momento em que as notícias publicadas não mencionavam que os julgamentos eram contra notórios criminosos de guerra, mas contra "batistianos" ou contra "partidários de Batista".

O certo é que nenhum funcionário administrativo da ditadura foi processado por crimes de guerra. Apenas foram julgados e condenados alguns dos mais notórios criminosos de guerra que puderam ser presos. Porque outros, como Ventura, Carratalá, Masferrer, Ugalde Carrillo e Pilar García escaparam e se refugiaram nos EUA, onde foram protegidos.

NASCE A "PRENSA LATINA"

A Revolução, dispondo ainda de escassos meios, não ficou na defensiva. Aceitou o desafio. Fidel falou em 15 de janeiro no Rotary Clube de Havana, denunciando a campanha da mídia e os perigos que ameaçavam Cuba. "Defender-nos-emos da calúnia... não temos nada que ocultar... Vamos chamar a imprensa internacional para que saiba a verdade..."

Três dias depois, o Movimento 26 de Julho, com um grupo de honestos e prestigiosos jornalistas, começou a despachar convites para realizar em Havana a Operação Verdade. Em menos de 48 horas, organizou-se tudo. As embaixadas de Cuba e a linha aérea Cubana de Aviação fizeram o possível para que quase 400 jornalistas do continente aceitassem vir a Havana.
Hospedaram-se, na maioria, nos 240 apartamentos do hotel Riviera, na rua Paseo e Malecón (beira-mar), onde também se criaram facilidades para a transmissão das informações e o transporte dos jornalistas. Entregava-se a cada jornalista, quando chegava a Havana uma pasta com materiais e fotos sobre alguns dos assassinatos e torturas da ditadura. Jornalistas de 20 importantes cidades dos EUA assistiram à reunião, entre os quais Jules Dubois, do Chicago Tribune e executivo da SIP, e quem, algum tempo depois, soube-se que era coronel da CIA.

A convite do governo revolucionário, participaram também os legisladores norte-americanos Adam Clayton Powel, um negro do Harlem, que tinha pedido a destituição do embaixador de seu país Earl T. Smith, por ter sido "um homem pró-Batista" e de Charles O. Porter, destacado líder do movimento de direitos civis que exigia respeito para Cuba.

Representando uma revista de Caracas, onde então residia, esteve presente o futuro Pêmio Nobel de Literatura: o colombiano Gabriel García Máquez.

Nesses dias, alguns jornalistas e escritores cubanos comentaram o tema dos fuzilamentos em seus jornais, entre os quais Guillermo Cabrera Infante, do diário Revolución, que deu um valioso testemunho antes de tornar-se intolerante, a ponto de negar que sua obra literária fosse publicada em Cuba. Em 6 de janeiro de 1959, escreveu: "Como é possível que tenha que dar explicações do justiçamento de uma figura tão desprezível como Cornelio Rojas? Sobram as explicações, porque não é isso que se busca. Quando toda a população de Cuba vivia sob o terror, quando crianças de 15 anos amanheciam feridas de balas nas ruas; quando se castrava, tiravam os olhos, torturava-se e se açoitava, nenhuma destas vozes se levantou para condenar esses fatos, nem sequer apareceram esses novos humanitários..."
E mais adiante, este escritor, que morreu em 2005 em Londres, expôs: "Os fuzilados são criminosos conhecidos, seus crimes foram divulgados por eles mesmos; um povo de sentimentos não moveu um dedo para impedir que continuem os justiçamentos; até os familiares dos justiçados sabem que se atua com espírito de honradez. A preocupação de certos obscuros senadores americanos, a dor do péssimo coração de Eisenhower, os editoriais da imprensa marrom do espectro jornalístico estão muito bem dirigidos. Não são as execuções o que tratam de deter, mas a marcha segura e infalível da Revolução Cubana...".
A Operação Verdade teve dois momentos-chave: uma concentração popular em 21 de janeiro na Avenida de las Misiones, em frente do antigo Palácio Presidencial, composta por um milhão de pessoas, e no dia seguinte, Fidel manteve um longo encontro com os jornalistas estrangeiros e cubanos no salão Copa Room do hotel Havana Riviera, onde o líder da Revolução respondeu às perguntas dos jornalistas sobre os julgamentos e sobre a realidade de Cuba. Em suas palavras iniciais dirigidas aos jornalistas, Fidel assinalou que nossos povos estavam desinformados porque as agências de informação não eram latino-americanas. "Eu lhes digo que a imprensa da América Latina deveria estar na posse dos meios de difusão que lhe permitam saber a verdade e não ser vítimas da mentira", e como resultado concreto da Operação Verdade, poucos meses depois, nasceu em Havana a agência informativa latino-americana Prensa Latina, organizada e dirigida por Jorge Ricardo Massetti. Outro jornalista presente na Operação Verdade, Gabriel García Márquez, também seria um dos fundadores dessa agência que, neste ano, completa também 50 anos de vida.

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