quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

Filiais de múltis sugam o país para compensar prejuízos das matrizes

Compromisso delas não é com nosso país

No dia 26, o Banco Central divulgou o resultado das contas externas de dezembro – e as do ano de 2008, Vamos nos deter aqui numa parte do balanço de pagamentos (que reúne toda a entrada e saída de recursos do país), a chamada “conta capital e financeira”:

1) Houve, em dezembro, entrada de US$ 8,1 bilhões em “investimentos diretos estrangeiros” (ou seja, dinheiro externo para comprar ou ampliar patrimônio dentro do país).

2) Houve saída de US$ 12,4 bilhões (US$ 5,4 bilhões em “saídas líquidas de investimentos em carteira”, ou seja, dinheiro puramente especulativo, e US$ 7 bilhões em “remessas líquidas de outros investimentos estrangeiros” - ou seja, “investimentos diretos estrangeiros” que saíram do país). Portanto, entre o que veio e o que foi em “investimentos diretos estrangeiros” e “investimentos estrangeiros em carteira (ou portfolio)”, houve uma saída de US$ 4,3 bilhões.

3) Porém, não nos referimos ainda às remessas de lucros ou de renda – as saídas acima são de “investimentos”, ou seja, retirada de capital para o exterior. Quanto às remessas líquidas (ou seja, já descontado delas o que entrou no país) de renda para o exterior, incluindo lucros, “somaram US$ 4 bilhões no mês. (….) Em dezembro, as saídas líquidas de renda de investimento direto somaram US$ 3,1 bilhões, dos quais US$ 2,8 bilhões relativos a lucros e dividendos” (todos os grifos são nossos).

4) Em suma, se examinarmos os dados da conta financeira referentes a “investimentos diretos” e “investimentos em carteira”, e os dados da “conta de rendas”, que inclui os lucros, temos que para US$ 8,1 bilhões que entraram em “investimento direto estrangeiro”, saíram US$ 16 bilhões, ou seja, o dobro.

5) Se somarmos a isso o déficit da “conta de serviços” (pagamentos de juros, fretes, viagens internacionais), que foi de US$ 1,6 bilhão, essa saída vai a US$ 17,6 bilhões, que foi compensada apenas em pequena parte pelo saldo comercial (US$ 2,3 bilhões). Nas contas do BC esse rombo é escamoteado por meio da adição/subtração de outros itens – sobretudo os chamados “investimentos diretos brasileiros no exterior” - que servem mais para confundir do que para esclarecer a situação real.

CRISE

Porém, poderia se dizer que estamos escolhendo um único mês como critério, e que isso falsificaria a avaliação. Mas seria um mero sofisma. Na verdade, mesmo com um saldo comercial de US$ 24,8 bilhões em 2008, tivemos um déficit na conta corrente do país de US$ 29 bilhões - e a remessa oficial de lucros das multinacionais foi de US$ 33,9 bilhões, ou seja, a sangria causada pela remessa de lucros foi mais de US$ 9 bilhões acima do que ganhamos com todas as nossas exportações, já subtraídas as importações.

Preferimos nos ater a dezembro porque o resultado é expressivo da tendência depois que os países capitalistas centrais entraram em crise. Acrescentemos apenas mais um dado, também do Banco Central: as reservas monetárias do país, que eram de US$ 206,8 bilhões em 30 de dezembro, diminuíram ao longo do mês de janeiro – no dia 30 de janeiro, estavam em US$ 200,8 bilhões. Em suma, diminuíram US$ 6 bilhões durante o primeiro mês do ano.

DRENAGEM

O que está acontecendo é que as filiais das empresas estrangeiras, os fundos estrangeiros, os bancos externos, estão drenando recursos do Brasil para os seus países de origem – sobretudo para os EUA – onde suas matrizes tiveram prejuízos monumentais.

Houve época em que alguns sujeitos, em especial o transviado Gustavo Franco, alardeavam os benefícios da enxurrada de “investimento direto estrangeiro” que invadia o país. Para se ter uma ideia, durante o governo Fernando Henrique entrou mais capital estrangeiro para adquirir patrimônio público ou privado nacional do que em todos os anos anteriores, desde que Cabral chegou aqui: o estoque de “investimento direto estrangeiro” pulou de US$ 41,7 bilhões em 1995 para US$ 187,0 bilhões em 2002 (dados do BC – dólar ao valor de 1995).

No ano passado, entraram mais US$ 45,1 bilhões no país em “investimento direto estrangeiro” - dinheiro para comprar empresas, para entrar em empresas, para aumentar o domínio estrangeiro sobre setores da economia.

O resultado nós podemos ver agora. É evidente que esperar que esse capital estrangeiro seja a base do nosso desenvolvimento, esperar que ele alicerce o crescimento econômico do Brasil, é ingenuidade ou ilusão – para não nos referirmos a casos mais graves, onde o problema é maluquice, ou má-fé, ou ambos.

O compromisso desse capital é com sua matriz – no máximo, com algumas camadas de seu país de origem. Não é com o nosso país. Seu inchaço aqui dentro serve apenas para aumentar de forma gigantesca as remessas de lucros para o exterior, tanto as oficiais quanto as disfarçadas sob a forma de pagamentos de empréstimos à matriz, royalties, etc., etc. & etc. Além do que, a ideia de que o “investimento direto estrangeiro” seria menos “volátil” do que outras formas de especulação comprovou-se, em boa medida, um engodo. O exemplo mais evidente são os fundos americanos (“hedge funds” e “fundos de investimento”) que compram e se desfazem de empresas de acordo com suas conveniências especulativas.

Com a crise, obviamente, essa drenagem de recursos tende a se tornar avassaladora. Ao mesmo tempo, os saldos comerciais tendem a ser menores – em janeiro, tivemos o primeiro déficit comercial mensal em oito anos.

Os problemas do Brasil, como é evidente, não serão resolvidos pelas multinacionais; não serão resolvidos por monopólios que têm matriz em outro país; não serão resolvidos, em suma, por deixarmos de ter uma economia própria, nacional. Isso somente tem servido e somente servirá para agravar todos os nossos problemas. Aliás, para ser preciso, nosso principal problema, depois dos anos de devastação do governo Fernando Henrique, consiste no domínio hipertrofiado e aberrante da economia nacional por empresas externas. O compromisso, repetimos, de uma filial de multinacional é com sua matriz. Não é com a economia brasileira, com o emprego dentro de nosso país e muito menos com o investimento e o crescimento de que necessitamos para que a nação seja próspera e justa.

O que os resultados de dezembro demonstram é a necessidade de controlarmos essa drenagem dos recursos do país para o exterior, sob pena, inclusive, de dentro em breve quebrarem as nossas contas externas. Se querem sair do país, que saiam – não são as empresas estrangeiras o motor do nosso desenvolvimento, e nunca serão. O que é impossível de aceitar, até por uma questão de sobrevivência, é a anemia a que, se não tomarmos providências, esses vampiros econômicos nos reduzirão, com sua grosseira parasitagem, com o brutal saque, pilhagem da economia brasileira.

CARLOS LOPES

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